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Notas sobre a portaria nº 62/2001 de 25 de Outubro

A avaliação das aprendizagens dos alunos do ensino básico foi regulada até ao ano lectivo passado, pelo disposto no Despacho Normativo nº 98-A/92, de 20 de Junho. Este despacho, apresentava-se efectivamente, com características inovadoras que, ainda hoje, se apresentam como elementos fundamentais para a orientação do professor na avaliação do processo ensino-aprendizagem:

  • o princípio de que a avaliação, no ensino básico, deveria assentar numa componente essencialmente formativa;
  • a consideração de que o conceito de “escolaridade básica obrigatória” implicava a excepcionalização da retenção dos alunos;
  • a perspectiva de que a retenção, como resposta para o insucesso do ensino-aprendizagem só deveria ser usada depois de esgotadas outras soluções;
  • o pressuposto de que existiriam efectivamente outras soluções alternativas à retenção que podiam promover o sucesso de cada aluno.

A falência deste despacho deve-se essencialmente, numa análise superficial, à forma como foi encarado pela comunidade educativa, ou seja, como indicações “facilitistas” do Ministério da Educação tendo em vista o sucesso estatístico. Numa análise mais profunda, encontramos a falência do referido despacho, nas más condições de trabalho e na falta de responsabilidade do Ministério para a concretização das medidas de apoio para os alunos com necessidades educativas e dificuldades de aprendizagem.
No preâmbulo da Portaria nº 62/2001, de 25 de Outubro, relativa à avaliação dos alunos do ensino básico, é referido que: “… tal como acontece a nível nacional, (Despacho Normativo nº30/2001) não se pretende introduzir uma ruptura no actual sistema de avaliação, antes se pretende manter na essência o mesmo e apenas corrigir os aspectos que se revelaram de mais difícil aplicação, potenciando os seus aspectos mais positivos…”. Podemos constatar que o objectivo será de continuar a filosofia do Despacho Normativo 98-A/92, melhorando alguns dos seus aspectos.
Neste sentido, teremos que reflectir sobre as novas condições em que se contextualiza a Portaria nº 62, ou seja a sua aplicação e operacionalização no âmbito da Reorganização Curricular do Ensino Básico.
O primeiro aspecto que se nos afigura da difícil operacionalização, são os vários aspectos que o professor terá que ter em conta na avaliação de cada aluno: competências gerais, transversais e específicas; currículo nacional (futuramente mais o currículo regional), projecto curricular de escola, projecto curricular de turma; critérios de avaliação em cada ciclo e por ano de escolaridade; elementos provenientes de cada disciplina e de cada área curricular não disciplinar, provas globais ou trabalho final de 9º ano e auto-avaliação. Estamos perante uma sucessão de tarefas sobre-humanas que poderão desencadear um processo de efeito contrário, ou seja o regresso às velhas práticas que não funcionaram com a reforma de Roberto Carneiro nem funcionarão com a Reorganização Curricular.
Uma vez mais se salienta a forma atabalhoada como foi desencadeada esta “reforma”, bem como as directrizes da tutela para as escolas e para os professores.
Outro aspecto importante que ressalta da Portaria nº62/2001 e do Despacho Normativo nº 30/2001, é o da transição de ciclo para o aluno que não desenvolveu as competências essenciais na Língua Portuguesa e noutra disciplina ou a mais do que duas disciplinas. No Despacho a transição só é possível com a unânimidade do Conselho de Turma, felizmente, a Portaria aponta para uma maioria de dois terços.
No entanto, importa analisar o princípio que está subjacente a esta medida e que nos parece ser a tentativa de “limpar” a imagem que ficou, na comunidade educativa, que o 98-A/92 promovia o sucesso artificial dos alunos.
Podemos considerar, em nota final, que entre as dificuldades de operacionaliação dos novos diplomas da avaliação, a forma como foi implementada a Reorganização Curricular do Ensino Básico e a manutenção da filosofia de base do 98-A/92, a qualidade do ensino-aprendizagem acaba, uma vez mais por ficar entregue ao bom-senso e empenhamento da classe docente.

 

António Lucas

Injustiça!

A publicação da Lei de Bases do Sistema Educativo (Lei nº46/86, de 14 de Outubro) vem considerar que a qualificação profissional dos educadores de infância e dos professores do ensino básico e secundário, se adquire através de cursos superiores que conferem o grau de licenciatura. Por outro lado, o Estatuto da Carreira Docente dos Educadores de Infância e do Professores dos Ensinos Básico e Secundário, aprovado pelo Decreto-Lei nº 139-A/90 de 28 de Abril, vem criar uma carreira única, com diferentes escalões de ingresso e de topo, de acordo com as habilitações académicas dos docentes.
Inúmeros docentes, no País e na Região, concluíram o seu bacharelato de três anos e, nalguns casos, de quatro anos. Fizeram a sua profissionalização em serviço e ingressaram numa carreira para qual tinham a habilitação máxima. Com as alterações decorrentes da Lei de Bases do Sistema Educativo e do Estatuto da Carreira Docente, viram alterados o seu escalão de ingresso e vedado o acesso ao topo da carreira.
Injustiça! As regras do “jogo” foram alteradas enquanto o mesmo decorria.
A maioria destes professores encontra-se já no último escalão, ou perto dele, pois tem, geralmente, mais de vinte e quatro anos de serviço, estando na contingência de permanecer no nono escalão durante dez anos (partindo do princípio que a aposentação voluntária se manterá nos trinta e seis anos de serviço).
Injustiça! Professores que já passaram por inúmeras reformas e alterações do sistema educativo e a quem é pedido um novo fôlego com a reorganização curricular, é-lhes vedado o acesso ao topo da carreira. Com certeza, apenas o orgulho e o brio profissional lhes poderá manter a motivação para este novo desafio.
Na verdade, o Ministério da Educação e a Secretaria Regional da Educação, pouco ou nada fizeram por estes docentes, com provas dadas de dedicação e empenho na profissão. Aliás, a posição da tutela a nível nacional e regional, parece ser a de não investir em complementos de formação para pessoas que estão no último terço da sua carreira.
Injustiça! Como o Ministério da Educação não dava resposta, no âmbito dos complementos de formação, aos bacharéis de nível um (título atribuído a estes docentes com formação superior para os distinguir dos outros equiparados a bacharéis) tiveram que recorrer ao ensino privado e ao pagamento de propinas avultadas.
Injustiça! Os professores da Região não podem, mesmo que tenham meios financeiros para o fazer, recorrer a este expediente porque não existem universidades privadas na Região e a Universidade dos Açores não manifestou qualquer interesse nos complementos de formação para os bacharéis de nível um, dado a sua diversificada formação inicial.
Injustiça! A Secretaria Regional da Educação apenas promoveu um complemento de formação para estes professores, em que se candidataram quinhentos e quarenta e cinco para cinquenta vagas, não se vislumbrando qualquer iniciativa para os próximos tempos.
Numa altura em que se pretende melhorar o sistema educativo, implementando uma reorganização curricular, a tutela esquece, de uma forma deliberada, que os professores são o motor da educação e nada fazendo para repor a justiça, não contribui para a concretização dos objectivos de melhoria do sistema de ensino na Região.

António Lucas

A propósito do plano e orçamento para a região (ou a reforma adiada)

Em vésperas de Reforma anunciada, com Escolas que se debatem com dificuldades estruturais e de recursos, com um corpo docente que nem sempre tem recebido a formação adequada, com quadros desajustados às necessidades, lógico seria esperar que o investimento em Educação na Região aumentasse nos próximos anos, para corresponder às intenções manifestadas pelos nossos Governantes.
Ao ouvir o Secretário Regional da Educação, nos meios de comunicação social, defender com unhas e dentes a Reorganização Curricular, falando em experimentação, aulas práticas, novas tecnologias, e outras coisas que tais, pensámos com regozijo: “Agora é que é ! Finalmente vamos ter as Escolas que faltam, os equipamentos que não temos, as tecnologias (que só são novas para nós, porque em países mais desenvolvidos já se tornaram habituais), mais professores nas  Escolas, melhor  formação para o pessoal, docente  e não docente ! ”
Procurámos assim, cheios de esperança, encontrar no Plano e Orçamento da Região para o próximo quadriénio, as verbas adequadas à concretização do objectivo de uma escola pública de qualidade, exigida pela nova Reforma.
Foi com frustração que verificámos que a construção de algumas Escolas continua adiada e que as verbas destinadas à Educação, em vez de aumentarem, diminuíram relativamente ao quadriénio anterior.
Mas afinal isto não é de estranhar ! Só vem confirmar a tendência que se tem vindo a acentuar ultimamente, se tivermos em consideração os diplomas legais que têm sido produzidos para este sector e algumas afirmações preferidas pelo Secretário que o tutela.
Na realidade, os nossos governantes imaginaram as Escolas como empresas a gerir e que, para serem lucrativas, têm que sofrer uma redução nos custos ao mesmo tempo que se rentabiliza a mão-de-obra. Só assim podemos perceber os sucessivos “cortes” em receitas e recursos humanos para as escolas públicas (o que se consegue, por exemplo, através do aumento do número de alunos por turma), as tentativas de pôr os professores a desempenhar funções que não lhes competem ou a trabalhar mais horas do que deviam, o desaparecimento dos incentivos à fixação de docentes, entre outras medidas tomadas e a tomar.
Esquecem-se que a “matéria-prima” da Educação são crianças e jovens humanos, e que, como consequência, o sucesso desta grande “empresa” não se compadece com reduções nos custos nem com a produção em cadeia.
A consequência mais provável da política economicista deste Governo será o aumento do insucesso educativo.
E previsível também será, depois, a responsabilização das Escolas e especialmente dos professores pelo fracasso de mais uma Reforma Educativa.

Delegação do Faial

Sindicatos para que vos quero?

Em pleno século XIX, estava a revolução burguesa no seu auge, surgem as primeiras organizações sindicais como forma de combater a miserabilização do proletariado recém chegado às urbes europeias.
Em muitos países europeus, lutou-se até à 2ª Guerra Mundial, por horários de trabalho de 8 horas diárias, férias pagas, igualdade de salários sem descriminarão sexual, fim do trabalho infantil, salários dignos, etc.. O atraso estrutural do nosso país fez com que alguns destes aspectos não tenham ainda sido concretizados.
Os recentes ataques de vários quadrantes políticos e de responsáveis por órgãos de comunicação social, que sobrevivem a expensas do estado, aos sindicatos de professores, demonstram que os sindicatos ainda são uma força incómoda ao livre exercício do poder, sobretudo quando este pretende restringir direitos de forma mais ou menos encapotada. Demonstram que um sindicato isento de orientações partidárias é uma instituição perigosa para o poder instituído e para aqueles que o servem ou pretendem sê-lo, demonstra, ainda, que a impossibilidade de controlá-lo leva a estas atitudes desesperadas na tentativa de desacreditar uma instituição com larga representatividade na classe docente e com provas dadas, ao longo de quase duas décadas de existência, de responsabilidade e empenho em prol dos seus sócios e da educação.

Perante as afirmações que vêm sido feitas importa clarificar alguns aspectos:

  1. Os sindicatos dispõem, de acordo com a lei, de um crédito global de horas para os seus dirigentes, reuniões de delegados e plenários. Este crédito global de horas, para benefício do sistema educativo e não dos sindicatos, é convertidos em dispensas totais ou parciais da componente lectiva, dos seus dirigentes.
  2. As despesas de funcionamento dos sindicatos são garantidas pelas cotizações dos seus associados.

A quem serve alterar a lei sindical?
Ao partido do governo.
Aos partidos que pretendem ser governo.
Aos interesses económicos instalados, que gostariam, numa economia global, possuir uma mão-de-obra dócil, terceiro mundista e apagar definitivamente mais de um século de história na conquista do direito ao trabalho, à dignidade e à felicidade!

 António Lucas

Um mau serviço à democracia

A principal virtude da democracia reside no facto deste regime político possuir intrinsecamente formas de controlo e regulação do poder. Entre outras, a liberdade de associação, nomeadamente de Associação Sindical, prevista na Constituição de 1976. 
O Senhor Secretário Regional da Educação e Cultura, pessoa de reconhecido mérito académico e, recentemente, acérrimo defensor da causa pública, prestou um mau serviço à democracia nas declarações que fez ao Diário Insular, no passado dia 17, ao dar a entender que os sindicatos de professores, são suportados pelo erário público. Devo esclarecer o seguinte:

  1. As despesas de funcionamento dos sindicatos de professores são suportadas pelos seus associados;
  2. As despesas com os vencimentos dos professores destacados ou com redução da componente lectiva são suportadas pela tutela, conforme está previsto na lei.

Ao Senhor Secretário nunca foi solicitada, pelos sindicatos, a divulgação dos custos dos professores destacados na Secretaria que tutela, tal como seria politicamente incorrecto, o Senhor Ministro da Justiça, publicar os custos da Provedoria.
Acredito firmemente que o Senhor Secretário, membro de um partido com provas dadas de ideais de democracia e pluralismo, não queira ressuscitar a Constituição de 1933 e o corporativismo.
Além disso, o Senhor Secretário parece esquecer que o Sindicato de Professores da Região Açores tem dado uma ajuda preciosa, junto dos seus associados e não só, relativamente à divulgação e esclarecimento do Decreto Regulamentar Regional nº1/2000 de 3 de Janeiro, relativo a concursos de pessoal docente, tanto na nossa Região como no Continente e Região Autónoma da Madeira.
No presente Ano Lectivo, este sindicato desenvolveu na Terceira, S. Miguel, Stª. Maria, Graciosa, S. Jorge, Pico e Faial, Acções de Formação de pessoal docente, no âmbito da Reorganização Curricular dos Ensinos Básico e Secundário, com formadores de reconhecido mérito nesta área, abrangendo um universo de várias centenas de professores, enquanto a Secretaria da Educação e Cultura apenas garantiu  a dois professores por Escola e Área escolar.
No âmbito da Formação Contínua de professores, o SPRA/IIL promoveu um vasto programa de Acções de Formação (17 Acções/24 turmas), abrangendo todos os níveis e sectores de ensino, em quase todas as ilhas, substituindo-se  à tutela, que não cumpriu com o seu plano de formação comprometendo a progressão na carreira de inúmeros docentes.
Assim, lamentamos que o Senhor Secretário não reconheça a função social que os Sindicatos desempenham, remetendo para a opinião pública uma visão parcial, revelando apenas os custos de um serviço sem o reconhecimento da componente social que é a principal razão da existência destas instituições.

Angra do Heroísmo, 19 de Julho de 2001
António Lucas

Paradoxos da Secretaria da Educação

Há algum tempo li, com agrado e admiração, no Açoriano Oriental, algumas declarações da Exma Directora Regional da Educação, onde refere a intenção de criar centros de audiovisuais e multimédia nas escolas, para que estas possam produzir trabalhos. Dando o benefício da dúvida, esperei para ver se algo se concretizava, porque as iniciativas de dinamização e apoio à acção pedagógica das escolas são tão poucas que já estou como S. Tomé “ver para crer”. Só que o tempo passa e, infelizmente, se não fosse a promoção de alguns eventos por outras Direcções Regionais, que não a da Educação, continuávamos a ver muito pouco.
O projecto anunciado merece, certamente, a concordância de todos os professores, da comunidade educativa e a minha, em particular, porque, durante muitos anos, “lutei” para que esta realidade se concretizasse na prática, embora, até ao momento, nunca tenha visto da parte da actual Secretaria da Educação qualquer empenho nesse sentido. Se algo há a registar, foi uma total indiferença no que respeita à importância da comunicação audiovisual e multimédia no processo ensino-aprendizagem, que se traduziu na desvalorização, abandono e menosprezo por todo o trabalho feito neste domínio, exceptuando a distribuição de computadores avulsos pelas escolas, decorrentes de projectos do ex-Ministério da Ciência e Tecnologia, sem qualquer plano de formação e acompanhamento dos professores, o que fez com que muito deste equipamento permanecesse durante largo tempo encaixotado ou encostado às paredes, sem contribuir para o fim a que se destinava.
Confesso a minha admiração ao dizerem que vão criar centros de recursos nas escolas, com capacidade para produzir trabalhos, quando abdicaram da tutela do único centro de recursos que dispunham com capacidade para tal –  o ex-CATE. Será que têm verdadeira noção do que estão a dizer quando se fala em produção de documentos desta natureza? Será que têm consciência dos recursos humanos e técnicos que isso implica? Se, na realidade, pretendem criar e dinamizar tais centros, como é que se explica que o Sr. Secretário Regional da Educação e Cultura tivesse, recentemente, acabado com as míseras duas horas de redução semanais atribuídas ao Director do Gabinete de Meios Audiovisuais das Escolas, admitindo que tal responsabilidade possa ser desempenhada por pessoal não docente? Não será isto um paradoxo?
Sempre defendi a importância do registo das actividades escolares, sobretudo os projectos mais relevantes, como forma de perpetuar no tempo um património de enorme relevância pedagógica, educativa, social e cultural, para que as nossas escolas pudessem ter história e memória, não só unindo afectivamente as várias gerações como, também, projectando, através de permutas, intercâmbios e concursos, no espaço regional, nacional e até internacional as marcas da nossa identidade cultural. Foram da ordem das centenas os trabalhos registados e produzidos pelo ex-CATE, envolvendo escolas de todos os níveis de ensino, cuja qualidade pedagógica e técnica dignificou a Região além fronteiras, arrecadando primeiros prémios, menções honrosas e até louvores em concursos nacionais e internacionais, de que recordo o concurso ?Audiovisuel et École?, onde o trabalho das nossas crianças e professores mereceu o prémio especial do júri em Bruxelas.
Há tempos que marcam, sobretudo aqueles onde a preocupação do fazer estava primeiro que a do publicitar, onde se sucediam os concursos denominados Contos e Cantos, Histórias e Canções Infantis, Danças e Bailinhos, Videogramas Escolares, onde se faziam colectâneas de documentos sobre a Região, intituladas Os Açores no Mundo, onde se promovia a banda desenhada, onde se faziam projectos, em vídeo, de elevada qualidade, tais como: Roteiro dos Museus Açorianos, Concelhos dos Açores, Açorianos de Cultura, série esta que mereceu divulgação televisiva, entre outros, que marcaram presença significativa em exposições regionais, nacionais e, de modo particular, nas nossas comunidades, aquando dos Encontros de Cultura Açoriana.
Tudo isto passou à margem da sensibilidade da Secretaria da Educação que, em vez de estimular e apoiar esta dinâmica, a ignorou e desvalorizou. No entanto, acena-se com a bandeira da Regionalização do Ensino e os professores, mais uma vez, que se desenrasquem como puderem, que estejam atentos à programação televisiva para irem registando nos seus vídeos excertos de programas culturais, ou até que comprem dois vídeos e quiçá uma mesa de mistura para fazerem pequenas montagens de modo a que os conteúdos se ajustem aos programas da sua disciplina, em suma, que sejam eles os ?piratas?, porque o Estado, zeloso dos seus direitos, não o quer ser. Que não o seja, acho muito bem, mas então que os produza, que os compre, ou, no mínimo, que faça protocolos com as diversas estações de televisão, inclusive com a RTP Nacional e Regional, que vive, em grande medida, de dinheiros públicos, e cujos arquivos poderiam ser um contributo valioso ao serviço da Educação. Eu nem falo de outras tecnologias porque, apesar do que se diz, são contadas as salas de aula que dispõem de computador, a não ser para os alunos da área tecnológica. Não basta dizer, como afirmou o Sr. Secretário, que “há que repensar as metodologias na sala de aula, que é importante debaterem-se as questões de natureza pedagógica, porque culpa-se o tempo de aulas e não o que se faz na aula”.
Até a revista de acção educativa INFORMAR, com mais de uma década de existência, espaço de cruzamento de ideias e experiências pedagógicas, que, além do mais, seria de enorme relevância para a história da Educação nos Açores, foi condenada ao seu desaparecimento com uma indiferença confrangedora, cuja falta nem passou despercebida à Comissão Regional de Desenvolvimento Curricular. Idêntica sorte teve a Mediateca Móvel, indo ao encontro das escolas mais distantes e das crianças com menos recursos e oportunidades. Não obstante, os professores são sempre os culpados do estado em que a Educação se encontra. É bom que se tenha em consideração a mensagem de Sua Excelência o Presidente da República, dirigida ao 8º Congresso Nacional dos Professores: ?É possível pedir muito aos professores, mas não é possível pedir-lhes tudo? e acrescentou: ?Não é justo exigir aos professores mais do que eles podem dar?.
Com tudo isto, chegamos à triste conclusão que a Secretaria Regional da Educação já não tem capacidade para gerir ou tutelar os serviços cuja acção se desenvolve, dominantemente, no seu âmbito de competências, tendo-se deixado ultrapassar por outras instituições que conseguiram criar, fora da escola, espaços tecnológicos de pesquisa, lazer e entretenimento muito mais atractivos, para as crianças e jovens, do que aqueles que a escola oferece para as suas aprendizagens curriculares. Não será mesmo um paradoxo?. Depois admiram-se da desmotivação dos alunos pela escola!

Armando Dutra

Estatísticas da Educação intoxicam a opinião pública

O desenvolvimento de estudos e pesquisas que visam tornar mais objectiva, clara e compreensível determinada realidade são sempre de louvar, sobretudo quando a isenção e independência de quem procede a determinada investigação tudo faz por merecer a credibilidade das informações ou dados que publica.
Na educação verifica-se, por parte dos governantes, uma preocupação, legítima, de recorrerem a estudos estatísticos, a fim de tornarem mais inteligível e mensurável múltiplos aspectos do contexto educativo, de modo a poderem melhor fundamentar as suas opções e decisões.
Fazendo fé na capacidade científica e técnica de quem investiga e na honestidade de quem promove a investigação, seria de esperar que a análise dos resultados fosse, tanto quanto possível, isenta e imparcial, de modo a aproximar-nos da desejável verdade. Infelizmente, em muitos casos, assim não acontece, pois, não raras vezes, propósitos obscuros, e outros nem tanto, estão subjacentes à manipulação de determinados números que distorcem, por completo, a realidade, numa clara intenção de manipulação da opinião pública.
Quando se divulga publicamente que o rácio professor/aluno na Região Autónoma dos Açores é de um professor para nove alunos, pressupõe que a mensagem que pretendem passar para a sociedade é a de que nesta Região os docentes estão numa situação altamente privilegiada, reunindo condições ímpares no contexto nacional e europeu, permitindo, deste modo, uma forte individualização do ensino e, por consequência, resultados que apenas não se atingem, única e exclusivamente, devido à falta do seu profissionalismo.
É esta visão deturpada e enganadora que temos de denunciar e combater, quando sabemos que a maioria das turmas até tem um número elevado de estudantes, havendo muitas que chegam a comportar entre 26 e 30 alunos, como o demonstra o Relatório Final da Organização do Ano Lectivo 2003/2004, da Inspecção Regional da Educação, numa amostra efectuada a um conjunto de unidades orgânicas, onde estas turmas numerosas chegam a atingir no 2º Ciclo 27% e no 3º Ciclo do Ensino Básico 10%. Onde está a honestidade da informação? Qual o propósito desta mistificação? Não estarão a contabilizar para o magnífico rácio os docentes que alimentam a “máquina” da Administração e quiçá do Governo, da Assembleia e de  outros Serviços cujas funções nada têm a ver directamente com a Educação? Porém, se assim não é, que culpa têm os professores da organização de um Sistema Educativo cuja disfuncionalidade permite esta desvirtuação estatística? Concedam aos professores a liberdade de decidir e tenho a certeza que todos prefeririam ser titulares de turmas com a dimensão anunciada, certos de que revolucionariam as estruturas educativas regionais e, consequentemente, fariam catapultar o sucesso educativo desta Região para o topo do ?ranking? nacional.
Idêntica análise poderia efectuar-se noutro domínio, onde se afirma que agora são realizadas 3824 acções de formação, tendo esta oferta, relativamente a 1996, crescido 616%. Como estes dados estão integrados num contexto de educação, pressuponho e o cidadão comum também, por certo, fará esta leitura, que os docentes dispõem, mais do que nunca, de um conjunto de oportunidades de formação que, no âmbito da formação contínua, lhes permitirá uma valorização pessoal e profissional de excelência no contexto nacional. Mais uma vez, todos os que possam fazer esta leitura são induzidos em erro, porque não só a Secretaria da Educação reduziu as oportunidades de formação para os docentes, numa clara discriminação negativa face aos demais colegas de profissão do todo nacional, que têm, neste momento, muito mais oportunidades de enriquecimento do seu currículo profissional, como, ainda, retirou a liberdade de cada qual poder gerir o seu percurso individual de formação, tendo, inexplicavelmente, que submeter a autorização superior qualquer formação, mesmo que se realize em período que não colida com a actividade lectiva, o que constitui, sem dúvida, um atentado à liberdade individual de qualquer cidadão.
Outros exemplos poderiam dar-se, tendo por base, por exemplo, uma afirmação da Srª Directora Regional da Educação ao dizer que a Região dispõe de um computador para 30 alunos, embora o ideal fosse um computador para 20 alunos. Dispensando-me, no momento, de qualquer comentário acerca da razoabilidade deste ideal, que me parece, aliás, pouco ousado, na medida em que não vejo que tipo de aprendizagem possam fazer vinte crianças ou jovens à volta de um computador, importa dizer que esta é mais uma falsa questão, na medida em que somos levados a concluir que todos os alunos têm igual acesso a este tipo de recursos tecnológicos para as suas aprendizagens, o que não corresponde à verdade, pois sabemos que em muitas escolas a maioria dos alunos apenas tem acesso a um ou dois computadores localizados, por norma, na biblioteca e que, se todos a eles recorressem, o acesso traduzir-se-ía numas magras horas por ano, muitíssimo distante do rácio divulgado, porque se assim não fosse, numa lógica de distribuição proporcional, cada turma poderia já dispor de um computador, o que está muito longe de acontecer.
Esta descontextualização da informação verifica-se em muitos outros aspectos que, de forma voluntária ou não, contribuem para a desinformação da sociedade e o consequente descrédito das entidades públicas. Há que promover uma cultura de seriedade e de responsabilidade. Podemos jogar com os números, mas não é legítimo nem justo jogar com as pessoas e muito menos induzi-las em erro. 

Armando Dutra

Também na Educação a fé é que nos salva!

No dia 29 de Janeiro fui confrontado com algumas questões, por uma jornalista do Açoriano Oriental, sobre o porquê dos resultados negativos das provas aferidas, referentes ao ano de 2002, que, ao que parece, face aos resultados disponíveis, colocam a Região Açores numa situação menos favorável , num contexto, já de si, pouco animador em termos nacionais. Embora tivesse a oportunidade de opinar sobre o assunto, julgo, no entanto, importante aprofundar um pouco mais algumas questões, clarificar outras e até fazer alguns comentários a informações e expressões atribuídas ao Sr. Secretário Regional da Educação e Cultura.
No nosso país há pouca tradição em avaliar aquilo que se faz e, quando se o faz, a tendência é a de procurar encontrar, logo de imediato, alguém a quem se possam assacar responsabilidades individuais e não colectivas, de modo a que não se perca muito tempo a reflectir sobre os assuntos e se continue a avançar, aos ziguezagues, consoante as ?modas? e os devaneios dos protagonistas do momento.
Na Educação passa-se o mesmo. Entendo, por isso, que urge fazer-se uma reflexão colectiva, séria e ponderada, sobre as múltiplas causas de um problema crónico na sociedade portuguesa que é o insucesso educativo e que, apesar das sucessivas reformas e contra-reformas, teima em persistir condenando, deste modo, o desenvolvimento do país.
Em matéria de educação todos somos co-responsáveis, mas não nos podemos esquecer que há hierarquias de responsabilidade. Quem define a política educativa do país não são os professores, os alunos, os pais ou a sociedade em geral. Há uma equipa ministerial que traça os objectivos, define os programas, determina as disciplinas e o tempo de leccionação, cria a rede educativa e as estruturas de apoio que entende por convenientes, restando aos professores e demais intervenientes no processo educativo dar cumprimento, com os parcos meios de que dispõem, às orientações superiormente determinadas. Se os nossos filhos não alcançam o sucesso desejado, não devemos imputar, sistematicamente, esta responsabilidade aos docentes que continuam a ter muito pouca participação na definição de tais políticas, apesar da tão apregoada autonomia das escolas. Devemos, sim, olhar para cima e tomar consciência de que o país carece de um pacto de regime, também para a Educação, para que se defina uma linha de rumo, coerente e consistente, que perdure no tempo, e não vagueie, constantemente, ao ?sabor? das políticas partidárias, de curto prazo, e das concepções dos ministros que, por vezes, chegam a ser três numa só legislatura, introduzindo mudanças sucessivas, acompanhadas de uma profusão legislativa e de exigências burocráticas que provocam uma tal instabilidade, um tal descrédito e um tal desânimo, cujos resultados estão à vista.
Reparem como o poder assume as suas responsabilidades, quer no plano nacional, quer no plano regional. Enquanto o Sr. Ministro da Educação, David Justino, quando confrontado com os maus resultados das provas aferidas, remete, de imediato, para os seus antecessores o ónus do insucesso educativo do país, na Região o Sr. Secretário Regional da Educação e Cultura, Álamo de Meneses, há quase oito anos com a tutela da pasta da Educação, utiliza a estratégia da ?fuga para a frente? dizendo a este jornal que, daqui a dez anos, ?vamos ser os melhores?, figurando, assim, no quadro de honra nacional. Com esta afirmação, que motivou o título deste artigo, ficamos por um lado surpresos e por outro estupefactos. Surpresos porque se com cerca de oito anos da sua governação estamos na cauda do país, como é que daqui a dez anos vamos estar no topo? Será que este optimismo visionário do Sr. Secretário resulta do facto de só agora ter reconhecido que, ao longo da sua governação, tem sobrevalorizado demasiado as questões de natureza administrativa em detrimento das de natureza pedagógica, pretendendo, agora, reorientar a sua política educativa? Ou será que confia mais na política dos seus sucessores do que na sua própria?.
A este sentimento junta-se o da estupefacção pelo facto de verificar que o Sr. Secretário faz bandeira de um projecto que ?consiste na colocação de mais de duzentos professores do 1º Ciclo do Ensino Básico nas escolas de 2º Ciclo, para prestar apoio aos estudantes que revelaram dificuldades em competências que deviam ter sido assimiladas nas primeiras etapas do ensino?. Como é possível alguém exaltar o pioneirismo desta medida e ufanar-se da necessidade de colocar tão elevado número de professores do 1º Ciclo nas escolas do 2º Ciclo, para tentar resolver, tardiamente, aprendizagens que deveriam realizar-se logo nos primeiros anos de escolaridade, como é o caso da leitura, da escrita e do cálculo?. Não será que esta necessidade traduz, precisamente, o insucesso de uma política que em vez de procurar solucionar os problemas no momento oportuno os adia e agrava, procurando, à posteriori, soluções de resultados duvidosos, em vez de efectuar o diagnóstico e uma intervenção atempada e adequada, logo nos primeiros anos de escolaridade, através de uma maior individualização do ensino e da colocação dos professores de apoio necessários, acompanhados por equipas especializadas? Não será que uma criança aprende melhor a ler e a escrever aos 7 e 8 anos de idade, se for bem enquadrada, acompanhada e apoiada, do que aos 13, 14 ou 15 anos ? Se assim é, por que é que, cada vez mais, se desinveste nos apoios educativos ao nível do 1º Ciclo do Ensino Básico, sabendo nós que os professores de apoio ali colocados, em muitos casos, servem apenas para constar, atendendo a que o que lhes é exigido, em primeira prioridade, são as substituições? Por que não criar equipas diferenciadas para uma e outra função, aplicando o determinado no Estatuto da Carreira Docente ou recorrendo à colocação de mais professores quando há tantos no desemprego?
Quem tem uma visão puramente economicista em Educação tenta, por norma, adiar os problemas, só que, no fim, acaba por pagar mais e obter menos resultados. A conclusão a que chegamos é que, afinal, o que devia ser investido no 1º Ciclo está a sê-lo, ?tarde e a más horas? como diz o povo, no 2º Ciclo. Será esta uma boa política? Não haverá aqui uma grande incongruência? Não será este um exemplo demonstrativo de que o tão apregoado aumento do investimento na Educação, a nível Regional, cai, por vezes, ?em saco roto??.
Termino como comecei dizendo que a fé é que nos salva, porque, infelizmente, a culpa nunca recai sobre quem manda, mas sempre sobre quem obedece, embora tenha a consciência de que enquanto continuarmos a ser das Regiões mais pobres do país, apesar das assimetrias aqui não serem das mais evidentes, dificilmente os resultados escolares nos permitirão alcançar, a este nível, posições de liderança no todo Nacional. A Escola continuará a ser o reflexo da sociedade em que vivemos, enquanto desenvolvermos políticas educativas que se limitem, apenas, a garantir o direito de acesso à Educação, e não o direito de sucesso, ou seja, enquanto não soubermos ou quisermos desenvolver políticas que garantam maiores condições de igualdade nas aprendizagens.

Armando Dutra

Ministério da Educação promove a condenação da escola pública

O direito de informar, de se informar e de ser informado está consagrado no artigo 37º da Constituição da República Portuguesa, razão pela qual o Ministério da Educação, ao pretender usar desta liberdade, mais uma vez, tornou públicos os resultados dos exames nacionais do 12º ano, julgando que está a prestar um bom serviço ao país, fazendo jus à desejada transparência dos serviços públicos.
Não pretendo, de modo algum, pôr em causa o direito que os cidadãos têm de estar informados, no sentido de poderem formular uma opinião crítica e de terem um papel interventivo na sociedade à qual pertencem. Porém, quando essa informação é passível de manipulação, induzindo a juízos de valor menos correctos, é nossa obrigação alertar para algumas injustiças que se cometem.
O Ministério da Educação, nos seus intentos obscuros, insiste em pretender que a sociedade faça, de forma redutora, uma avaliação do trabalho desenvolvido pelas escolas através de uma mera leitura dos resultados dos exames nacionais, descontextualizados do processo ensino-aprendizagem e desfasados dos objectivos e finalidades a que o sistema educativo se propõe. Esquece-se, porém, que muitas das razões de tal insucesso são endógenas ao próprio sistema de que o Ministério é o principal responsável, não tendo demonstrado capacidade nem competência  para agir sobre elas.
Os exames não podem constituir o único instrumento de avaliação das escolas porque, como dizia um colega meu, constitui um ?termómetro avariado?, dado que, nas mesmas condições, nem sempre se comporta da mesma maneira. A demonstrá-lo está o facto de na mesma escola e com o mesmo professor os resultados obtidos nos exames  de uma determinada disciplina serem num ano bons e no outro maus, consoante as turmas. Tal facto explica a existência  de causalidades  múltiplas que interferem no processo de aprendizagem, pelo que estigmatizar escolas ou imputar responsabilidades directas a quem quer que seja, com base num único elemento de avaliação, é um exercício de irresponsabilidade.
Esta vontade explícita de condenação da escola pública e, quiçá, de exaltação do ensino privado, visível nos tão propalados ?rankings? das escolas, traduz uma desonestidade intelectual atroz, ao pretender-se comparar o incomparável, uma vez que só a pura hipocrisia não permite ver que as condições de acesso e de sucesso em ambos os sistemas são tão desiguais quanto o são as ambições, os projectos de vida e as  condições sócio-económicas das crianças e jovens que as frequentam. Basta ter em consideração que a escola pública vive apenas com os magros recursos financeiros do orçamento geral do Estado, enquanto as privadas partilham um duplo orçamento, o que vem do Estado e o que advém das gordas mensalidades das famílias, que, por sinal, detêm  os maiores recursos do país.
Vejam se nos colégios privados proliferam as turmas heterogéneas, as crianças com necessidades educativas especiais, os alunos provenientes de bairros degradados partilhando a fome, a miséria, a pobreza, o analfabetismo, o alcoolismo e a droga, se há diversidade étnica, se há quem divida quartos desconfortáveis com dois, três, quatro irmãos, ou outros familiares, sem uma secretária onde possam estudar, sem uma estante onde possam consultar uma enciclopédia e sem um computador onde possam aceder à internet . Vejam se nos colégios privados há meninos que nunca viram uma peça de teatro, manipularam um jornal ou uma revista, ou fizeram uma qualquer viagem marítima ou aérea, se há, porventura, quem tenha de partilhar os trabalhos rurais ou as tarefas domésticas a quem é entregue, muitas vezes, a responsabilidade de cuidar dos irmãos mais novos, de contribuir com o trabalho infantil para o sustento da família, ou de sofrer todo o tipo de violência para frequentar a escola sob ameaça de retirarem aos pais o dito rendimento social de inserção.
É importante que os governantes, os analistas, os fazedores de opinião tenham consciência de que é este mundo que a escola pública acolhe e que a privada rejeita. É bom que saibam que é na escola pública que estão as ?Joanas? deste país, e que é lá que se encontra a maioria das crianças e jovens que sofre, em silêncio ou com revolta, as injustiças da nossa sociedade. É bom que saibam que são os professores do ensino público que amparam este choque gritante da sociedade, a quem o sistema lhes pede para integrar e não excluir, para ser cooperante e não competitivo, para educar e não apenas instruir, em suma, para promover a cidadania solidária, os valores humanistas e não a competição, o individualismo, o egoísmo e o culto dos melhores.
Os professores do ensino público vivem o sufoco permanente da contradição do sistema que ora lhes exige e pede um modelo de ensino e de avaliação, sobretudo no Ensino Básico, do o 1º ao 3º Ciclo, que relativize os aspectos cognitivos em favor da construção da cidadania, dos comportamentos, das atitudes, dos valores, do saber ser e estar, impondo que a retenção dos alunos até ao 9º ano de escolaridade seja a menor possível, para evitar o abandono e insucesso escolar nem que seja administrativamente, para, logo de seguida, no Ensino Secundário fazer-se a inversão dos valores, onde a cultura da exigência e as finalidades do ensino se alteram radicalmente, apesar da tão defendida articulação curricular entre os diversos níveis e ciclos de ensino, esquecendo-se de que faltam aos jovens os hábitos de trabalho e as bases necessárias para o desejado sucesso.
Sente-se que estamos a viver um período de grande confusão, clara indefinição e alguma tensão, onde parece sobrelevar algum desejo de regresso ao passado. Os professores sentem-se ?desnorteados? neste terreno movediço onde ora se exaltam as virtudes dos exames e se exige que todo o esforço de aprendizagem seja direccionado neste sentido, ora se relativiza a sua importância e exalta a avaliação contínua assumindo que não é possível nem justo pretender-se avaliar numa ou duas horas o que foi construído em vários anos. Importa salientar que, não raras vezes, se acusam as equipas ministeriais de estarem distanciadas da realidade escolar, com critérios de exigência desfasados do contexto educativo e das aprendizagens reais dos alunos.
É com esta dualidade de critérios que o Ministério da Educação entra em contradição ao pretender, por um lado, que a sociedade avalie o trabalho das escolas e dos professores tendo, unicamente, por base o resultado dos exames nacionais, quando, por outro lado, o próprio Ministério lhe atribui apenas um peso relativo para a nota final dos alunos, o que, só por si, traduz a pouca significância que estes, no seu entender, devem ter no contexto global do processo educativo.
Não é possível continuar a alimentar esta ambiguidade, sob pena de se instalar o caos na escola pública. Quem sabe se não constituirá o propósito de alguns!   

                                                                                  Armando Dutra

Avaliação de alunos, de professores ou de escolas…!?

O secretário regional da Educação e Ciência (SREC) presenteou, no último Natal, a comunidade educativa açoriana com um novo Regulamento de Avaliação das Aprendizagens no Ensino Básico publicado, no dia 23 de Dezembro, em anexo à Portaria n.º 94/2004.

Recentemente, nesta coluna e sob o título ? “Sistema Educativo Regional” segundo Álamo de Meneses ?, aflorei, ainda que sumariamente, as questões relacionadas com a que era, na altura, uma proposta de avaliação para o ensino básico na Região referindo-me, no essencial, ao facto do SREC se estar a preparar para publicar um modelo de avaliação diferenciado do que se aplica ao restante território nacional (continente e Madeira) e, assim, dar mais um passo para a criação de um Sistema Educativo Regional, aliás o seu grande objectivo político.
A comunidade educativa está, só agora, a “desembrulhar” esta prenda natalícia e a tomar consciência das implicações que as alterações introduzidas na avaliação do ensino básico, de entre as quais a introdução de “exames” no 4.º, 6.º e 9.º anos, talvez não visem aqueles a quem o processo de avaliação se dirige ? os alunos.
A avaliação sumativa externa é da responsabilidade da Direcção Regional de Educação (DRE) e materializa-se na realização de provas no final de cada ciclo do ensino básico nas áreas disciplinares de Língua Portuguesa e Matemática, no entanto, a valorização da avaliação sumativa externa (exames) para a classificação final dos alunos, no respeito pela autonomia pedagógica, fica ao critério dos Conselhos Pedagógicos de escola, ou seja, cada escola poderá atribuir à classificação obtida pelos alunos a valorização que entender (5%, 10%, 20%, 30% … ou outro qualquer).
O facto da entidade responsável pela avaliação externa (DRE) não lhe definir um peso próprio no cálculo da classificação final dos alunos, deixando essa responsabilidade a cada unidade orgânica e, sabendo-se que o SREC pretende tornar público os resultados da avaliação sumativa externa, só pode ter um significado ? a avaliação do sistema; visto que a avaliação feita aos alunos continua, e bem, a depender das escolas.
Outros efeitos serão produzidos pelas alterações que a Portaria n.º 92/20004 veio introduzir na avaliação da aprendizagens do Ensino Básico, bastará, para tanto, fazer-lhe uma atenta análise. No entanto, hoje apenas pretendo enfatizar o aspecto a que me tenho vindo a referir e que ,claramente, visa a avaliação das escolas que, naturalmente, será transformada num “ranking” regional, com todos os efeitos perniciosos que lhe estão associados.
A avaliação não é, no seio dos docentes, um assunto que reúna unanimidade e é do conhecimento público que relativamente à realização de exames no Ensino Básico alguns professores, talvez em busca da autoridade perdida, os defendem acerrimamente, outros, como eu, valorizam os percursos, os contextos, a avaliação formativa e globalizante.
Mas será, para quem considera que os exames são uma peça essencial no processo de avaliação, que estes são os exames de que estavam à espera? É que estes exames não vão responsabilizar alunos, não vão disciplinar alunos, não vão contribuir para que os alunos saiam melhor preparados da escola. Estes exames vão servir, isso sim, para continuar a proletarizar os professores, estigmatizar as escolas e denegrir a imagem do ensino público.
Importa, igualmente, que os Pais e Encarregados de Educação estejam atentos às alterações que foram introduzidas no modelo de avaliação das aprendizagens do ensino básico, desde logo, questionando-se porque não foram criadas condições para participarem na discussão deste instrumento da avaliação dos seus filhos e educandos. instrumento que os diferencia das restantes crianças e jovens que vivem no território continental e madeirense.
Até onde deixaremos ir o Professor Álamo Meneses neste processo de ostracização do ensino na região?

14-01-2005
Aníbal C. Pires

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