Passada uma década sobre a reforma do ensino, protagonizada pelo Ministro Roberto Carneiro chega-nos a Reorganização Curricular do Ensino Básico, que o Ministério da Educação se recusou a chamar “reforma” mas que nos parece apresentar alterações muito mais profundas do que a de Roberto Carneiro.
Num país com défice de planeamento e de verbas para a educação, uma vez mais se apela para a capacidade inventiva e de improviso dos professores. No entanto, a maioria do corpo docente encontra-se no último terço da sua carreira, ansiando pela reforma voluntária aos 30 anos de serviço, cansados de muito dar e pouco receber, de alterações inócuas do sistema, confrontados com uma enorme massa de alunos adversos ao cumprimento de regras e cada vez mais protegidos nos seus actos de indisciplina.
O governo PSD implementou uma reforma faseada, deu alguma formação aos professores e disponibilizou verbas para uma reforma que incluía 9 anos de escolaridade obrigatória. No entanto, limitou-se a fazer pequenas alterações e pequenos “cortes” nos programas, criou uma área de Desenvolvimento Pessoal e Social – que nunca funcionou – e uma área de projecto, a “Área-Escola”, sabendo que a maioria dos professores não tinha formação para a concretizar.
O governo PS propõe alterações muito mais profundas e que certamente vão alterar o funcionamento das escolas, sobretudo das Básicas Integradas e das E.B. de 2º e 3º ciclos. Este modelo possui inúmeras potencialidades mas exige das escolas e dos seus corpos docentes um enorme esforço de readaptação a novos modelos, nomeadamente na prática lectiva. Ele assenta na capacidade da escola e dos professores para gerir o processo de ensino-aprendizagem de um modo a adequá-lo às realidades de cada região/escola/alunos.
Entretanto, os programas não sofrem alterações, apesar de a carga lectiva das disciplinas ter diminuído, provavelmente devido às pressões dos editores de manuais escolares. Em vez disso, temos as “competências essenciais”, ou seja, aquilo que o aluno, no fim de cada ciclo, deve saber e saber fazer. Ao que parece algumas destas competências já estão definidas.
Temos ainda a Área de Estudo Acompanhado que peca por tardia e a Área de Projecto de Turma que, esperemos, funcione melhor que a generalidade da Área-Escola.
Apesar da autonomia das escolas e deste pressuposto ser necessário para o sucesso da Reorganização Curricular, o Ministério não abdica dos seus mecanismos de controle como as famigeradas provas de aferição e, na Região, o projecto de diploma da Gestão Administrativa e Pedagógica dos Alunos, que a ser aprovado como está, na forma de projecto, retira competências pedagógicas às escolas e aumenta-lhes o trabalho administrativo.
Voltando aos professores, como já disse, é-lhes pedido tudo a troco de nada, senão vejamos: tanto a nível nacional como regional apenas dois professores por escola, sendo um do Conselho Executivo e outro do Pedagógico receberão formação. Um contingente enorme de professores, sobretudo bacharéis de nível um (os mais injustiçados em todos os processos de alterações na carreira), continua à espera de Complementos de Formação que lhes permita melhorar a prática lectiva e a justa aspiração de chegar ao topo da carreira.
Por último, os professores de muitas escolas do país e da Região, continuam a aguardar por melhores escolas e condições de trabalho.
António Lucas