Sexta-feira, Abril 26, 2024
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“Os fins justificam os meios” (ou a história da Maria e da Vanessa)

No século XVI, Nicolau Maquievel separou definitivamente a moral da política ao escrever o livro “O Príncipe”, espécie de manual do governante, que se iria repercutir nas teses absolutistas do século XVII. Passados cinco séculos da publicação do referido livro, encontramos, ainda hoje, acções dos nossos governantes norteadas pelos princípios maquievélicos da manutenção e perpetuação do poder a qualquer custo.
A publicação do Decreto Regulamentar Regional nº4-A/2002/A, de 21 de Janeiro trouxe para a rua os sindicatos de professores, bem como milhares de docentes que expressaram a sua indignação pelas injustiças por ele criadas. Na altura o Senhor Secretário da Educação argumentava que o referido Decreto era um documento fundamental para a estabilização do corpo docente na Região.
O Sindicato de Professores da Região Açores, na altura, para além do pedido de verificação suspensiva da constitucionalidade do diploma e da queixa na Provedoria, alertou a opinião pública para os argumentos falaciosos da tutela e que a publicação do referido decreto não traria qualquer mais valia para o sistema, pelo contrário, traria uma enorme perturbação e permitia que candidatos com baixa graduação profissional (médias baixas de curso e pouco ou nenhum tempo de serviço) ultrapassassem candidatos melhor graduados.
Assim, cumpre-se a pergunta. Quem beneficia do Decreto Regulamentar Regional nº 4-A/2002/A, de 21 de Janeiro?
Por um lado, a Universidade dos Açores, carente de alunos e que assim vê os seus estagiários a ultrapassarem os outros candidatos, tornando-se numa universidade apetecível para quem quer iniciar um curso de ensino.
Por outro, o governo que pensava vir a arrecadar dividendos políticos e eleitorais. Políticos, porque, embora de forma errada, quis demostrar um rasgo de autonomia e calar qualquer iniciativa idêntica da oposição. Eleitorais, porque a maioria dos professores concorrentes não estão inscritos nos cadernos eleitorais dos Açores – por isso não fazem mossa – enquanto o Luizinho ou a Mafaldinha, que fizeram estágio nos Açores ou entraram na universidade pelo contingente Açores, agora com possibilidades de colocação, bem como os seus familiares próximos irão votar no partido do Governo?
Na verdade, se tivermos em conta os resultados das legislativas, na região, nem isso conseguiram. Mas isso é um assunto para discussão interna no partido.
Para percebermos a história da Maria e da Vanessa ( candi-datos reais retirados das listas de concursos, mas, obviamente, com nomes falsos), temos que perceber os mecanismos do concurso externo (para entrar para o quadro). Este tem duas modalidades: o concurso por três anos a que apenas podem concorrer os candidatos com três anos de leccionação nos Açores, ou que tenham feito o estágio na região, ou que tenham sido bolseiros, ou que tenham entrado na universidade pelo contingente Açores e os  que não preenchem nenhum destes requisitos que apenas podem concorrer por um ano, por isso, posicionados atrás dos primeiros.
Os não colocados, transferem a sua ordenação para  concurso de contrato administrativo, perpetuando-se a injustiça e, até agravando-se, pois os candidatos que terminaram o estágio nos Açores, podem concorrer à frente dos que tinham concorrido no concurso externo apenas por um ano.
A Maria e a Vanessa concorreram ao concurso externo e ambas não foram colocadas, por isso, constavam nas listas ordenadas do concurso para contrato administrativo. A Maria tem 40 anos de idade, 14,4 de média de curso e 10 anos de serviço. A Vanessa tem 23 anos de idade, 13 valores de média de curso e nunca trabalhou no ensino. Em resultado da aplicação  do Decreto Regulamentar Regional nº4-A/2002/A, de 21 de Janeiro, a Vanessa encontra-se a trabalhar no ano lectivo 2002/03 e a Maria está desempregada e sem perspectivas de voltar a trabalhar no ensino depois de já ter trabalhado durante 10 anos.

Não hà fins que justifiquem tais meios!

António Lucas
Dirigente do SPRA

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