Quinta-feira, Março 28, 2024
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Estatísticas da Educação intoxicam a opinião pública

O desenvolvimento de estudos e pesquisas que visam tornar mais objectiva, clara e compreensível determinada realidade são sempre de louvar, sobretudo quando a isenção e independência de quem procede a determinada investigação tudo faz por merecer a credibilidade das informações ou dados que publica.
Na educação verifica-se, por parte dos governantes, uma preocupação, legítima, de recorrerem a estudos estatísticos, a fim de tornarem mais inteligível e mensurável múltiplos aspectos do contexto educativo, de modo a poderem melhor fundamentar as suas opções e decisões.
Fazendo fé na capacidade científica e técnica de quem investiga e na honestidade de quem promove a investigação, seria de esperar que a análise dos resultados fosse, tanto quanto possível, isenta e imparcial, de modo a aproximar-nos da desejável verdade. Infelizmente, em muitos casos, assim não acontece, pois, não raras vezes, propósitos obscuros, e outros nem tanto, estão subjacentes à manipulação de determinados números que distorcem, por completo, a realidade, numa clara intenção de manipulação da opinião pública.
Quando se divulga publicamente que o rácio professor/aluno na Região Autónoma dos Açores é de um professor para nove alunos, pressupõe que a mensagem que pretendem passar para a sociedade é a de que nesta Região os docentes estão numa situação altamente privilegiada, reunindo condições ímpares no contexto nacional e europeu, permitindo, deste modo, uma forte individualização do ensino e, por consequência, resultados que apenas não se atingem, única e exclusivamente, devido à falta do seu profissionalismo.
É esta visão deturpada e enganadora que temos de denunciar e combater, quando sabemos que a maioria das turmas até tem um número elevado de estudantes, havendo muitas que chegam a comportar entre 26 e 30 alunos, como o demonstra o Relatório Final da Organização do Ano Lectivo 2003/2004, da Inspecção Regional da Educação, numa amostra efectuada a um conjunto de unidades orgânicas, onde estas turmas numerosas chegam a atingir no 2º Ciclo 27% e no 3º Ciclo do Ensino Básico 10%. Onde está a honestidade da informação? Qual o propósito desta mistificação? Não estarão a contabilizar para o magnífico rácio os docentes que alimentam a “máquina” da Administração e quiçá do Governo, da Assembleia e de  outros Serviços cujas funções nada têm a ver directamente com a Educação? Porém, se assim não é, que culpa têm os professores da organização de um Sistema Educativo cuja disfuncionalidade permite esta desvirtuação estatística? Concedam aos professores a liberdade de decidir e tenho a certeza que todos prefeririam ser titulares de turmas com a dimensão anunciada, certos de que revolucionariam as estruturas educativas regionais e, consequentemente, fariam catapultar o sucesso educativo desta Região para o topo do ?ranking? nacional.
Idêntica análise poderia efectuar-se noutro domínio, onde se afirma que agora são realizadas 3824 acções de formação, tendo esta oferta, relativamente a 1996, crescido 616%. Como estes dados estão integrados num contexto de educação, pressuponho e o cidadão comum também, por certo, fará esta leitura, que os docentes dispõem, mais do que nunca, de um conjunto de oportunidades de formação que, no âmbito da formação contínua, lhes permitirá uma valorização pessoal e profissional de excelência no contexto nacional. Mais uma vez, todos os que possam fazer esta leitura são induzidos em erro, porque não só a Secretaria da Educação reduziu as oportunidades de formação para os docentes, numa clara discriminação negativa face aos demais colegas de profissão do todo nacional, que têm, neste momento, muito mais oportunidades de enriquecimento do seu currículo profissional, como, ainda, retirou a liberdade de cada qual poder gerir o seu percurso individual de formação, tendo, inexplicavelmente, que submeter a autorização superior qualquer formação, mesmo que se realize em período que não colida com a actividade lectiva, o que constitui, sem dúvida, um atentado à liberdade individual de qualquer cidadão.
Outros exemplos poderiam dar-se, tendo por base, por exemplo, uma afirmação da Srª Directora Regional da Educação ao dizer que a Região dispõe de um computador para 30 alunos, embora o ideal fosse um computador para 20 alunos. Dispensando-me, no momento, de qualquer comentário acerca da razoabilidade deste ideal, que me parece, aliás, pouco ousado, na medida em que não vejo que tipo de aprendizagem possam fazer vinte crianças ou jovens à volta de um computador, importa dizer que esta é mais uma falsa questão, na medida em que somos levados a concluir que todos os alunos têm igual acesso a este tipo de recursos tecnológicos para as suas aprendizagens, o que não corresponde à verdade, pois sabemos que em muitas escolas a maioria dos alunos apenas tem acesso a um ou dois computadores localizados, por norma, na biblioteca e que, se todos a eles recorressem, o acesso traduzir-se-ía numas magras horas por ano, muitíssimo distante do rácio divulgado, porque se assim não fosse, numa lógica de distribuição proporcional, cada turma poderia já dispor de um computador, o que está muito longe de acontecer.
Esta descontextualização da informação verifica-se em muitos outros aspectos que, de forma voluntária ou não, contribuem para a desinformação da sociedade e o consequente descrédito das entidades públicas. Há que promover uma cultura de seriedade e de responsabilidade. Podemos jogar com os números, mas não é legítimo nem justo jogar com as pessoas e muito menos induzi-las em erro. 

Armando Dutra

Também na Educação a fé é que nos salva!

No dia 29 de Janeiro fui confrontado com algumas questões, por uma jornalista do Açoriano Oriental, sobre o porquê dos resultados negativos das provas aferidas, referentes ao ano de 2002, que, ao que parece, face aos resultados disponíveis, colocam a Região Açores numa situação menos favorável , num contexto, já de si, pouco animador em termos nacionais. Embora tivesse a oportunidade de opinar sobre o assunto, julgo, no entanto, importante aprofundar um pouco mais algumas questões, clarificar outras e até fazer alguns comentários a informações e expressões atribuídas ao Sr. Secretário Regional da Educação e Cultura.
No nosso país há pouca tradição em avaliar aquilo que se faz e, quando se o faz, a tendência é a de procurar encontrar, logo de imediato, alguém a quem se possam assacar responsabilidades individuais e não colectivas, de modo a que não se perca muito tempo a reflectir sobre os assuntos e se continue a avançar, aos ziguezagues, consoante as ?modas? e os devaneios dos protagonistas do momento.
Na Educação passa-se o mesmo. Entendo, por isso, que urge fazer-se uma reflexão colectiva, séria e ponderada, sobre as múltiplas causas de um problema crónico na sociedade portuguesa que é o insucesso educativo e que, apesar das sucessivas reformas e contra-reformas, teima em persistir condenando, deste modo, o desenvolvimento do país.
Em matéria de educação todos somos co-responsáveis, mas não nos podemos esquecer que há hierarquias de responsabilidade. Quem define a política educativa do país não são os professores, os alunos, os pais ou a sociedade em geral. Há uma equipa ministerial que traça os objectivos, define os programas, determina as disciplinas e o tempo de leccionação, cria a rede educativa e as estruturas de apoio que entende por convenientes, restando aos professores e demais intervenientes no processo educativo dar cumprimento, com os parcos meios de que dispõem, às orientações superiormente determinadas. Se os nossos filhos não alcançam o sucesso desejado, não devemos imputar, sistematicamente, esta responsabilidade aos docentes que continuam a ter muito pouca participação na definição de tais políticas, apesar da tão apregoada autonomia das escolas. Devemos, sim, olhar para cima e tomar consciência de que o país carece de um pacto de regime, também para a Educação, para que se defina uma linha de rumo, coerente e consistente, que perdure no tempo, e não vagueie, constantemente, ao ?sabor? das políticas partidárias, de curto prazo, e das concepções dos ministros que, por vezes, chegam a ser três numa só legislatura, introduzindo mudanças sucessivas, acompanhadas de uma profusão legislativa e de exigências burocráticas que provocam uma tal instabilidade, um tal descrédito e um tal desânimo, cujos resultados estão à vista.
Reparem como o poder assume as suas responsabilidades, quer no plano nacional, quer no plano regional. Enquanto o Sr. Ministro da Educação, David Justino, quando confrontado com os maus resultados das provas aferidas, remete, de imediato, para os seus antecessores o ónus do insucesso educativo do país, na Região o Sr. Secretário Regional da Educação e Cultura, Álamo de Meneses, há quase oito anos com a tutela da pasta da Educação, utiliza a estratégia da ?fuga para a frente? dizendo a este jornal que, daqui a dez anos, ?vamos ser os melhores?, figurando, assim, no quadro de honra nacional. Com esta afirmação, que motivou o título deste artigo, ficamos por um lado surpresos e por outro estupefactos. Surpresos porque se com cerca de oito anos da sua governação estamos na cauda do país, como é que daqui a dez anos vamos estar no topo? Será que este optimismo visionário do Sr. Secretário resulta do facto de só agora ter reconhecido que, ao longo da sua governação, tem sobrevalorizado demasiado as questões de natureza administrativa em detrimento das de natureza pedagógica, pretendendo, agora, reorientar a sua política educativa? Ou será que confia mais na política dos seus sucessores do que na sua própria?.
A este sentimento junta-se o da estupefacção pelo facto de verificar que o Sr. Secretário faz bandeira de um projecto que ?consiste na colocação de mais de duzentos professores do 1º Ciclo do Ensino Básico nas escolas de 2º Ciclo, para prestar apoio aos estudantes que revelaram dificuldades em competências que deviam ter sido assimiladas nas primeiras etapas do ensino?. Como é possível alguém exaltar o pioneirismo desta medida e ufanar-se da necessidade de colocar tão elevado número de professores do 1º Ciclo nas escolas do 2º Ciclo, para tentar resolver, tardiamente, aprendizagens que deveriam realizar-se logo nos primeiros anos de escolaridade, como é o caso da leitura, da escrita e do cálculo?. Não será que esta necessidade traduz, precisamente, o insucesso de uma política que em vez de procurar solucionar os problemas no momento oportuno os adia e agrava, procurando, à posteriori, soluções de resultados duvidosos, em vez de efectuar o diagnóstico e uma intervenção atempada e adequada, logo nos primeiros anos de escolaridade, através de uma maior individualização do ensino e da colocação dos professores de apoio necessários, acompanhados por equipas especializadas? Não será que uma criança aprende melhor a ler e a escrever aos 7 e 8 anos de idade, se for bem enquadrada, acompanhada e apoiada, do que aos 13, 14 ou 15 anos ? Se assim é, por que é que, cada vez mais, se desinveste nos apoios educativos ao nível do 1º Ciclo do Ensino Básico, sabendo nós que os professores de apoio ali colocados, em muitos casos, servem apenas para constar, atendendo a que o que lhes é exigido, em primeira prioridade, são as substituições? Por que não criar equipas diferenciadas para uma e outra função, aplicando o determinado no Estatuto da Carreira Docente ou recorrendo à colocação de mais professores quando há tantos no desemprego?
Quem tem uma visão puramente economicista em Educação tenta, por norma, adiar os problemas, só que, no fim, acaba por pagar mais e obter menos resultados. A conclusão a que chegamos é que, afinal, o que devia ser investido no 1º Ciclo está a sê-lo, ?tarde e a más horas? como diz o povo, no 2º Ciclo. Será esta uma boa política? Não haverá aqui uma grande incongruência? Não será este um exemplo demonstrativo de que o tão apregoado aumento do investimento na Educação, a nível Regional, cai, por vezes, ?em saco roto??.
Termino como comecei dizendo que a fé é que nos salva, porque, infelizmente, a culpa nunca recai sobre quem manda, mas sempre sobre quem obedece, embora tenha a consciência de que enquanto continuarmos a ser das Regiões mais pobres do país, apesar das assimetrias aqui não serem das mais evidentes, dificilmente os resultados escolares nos permitirão alcançar, a este nível, posições de liderança no todo Nacional. A Escola continuará a ser o reflexo da sociedade em que vivemos, enquanto desenvolvermos políticas educativas que se limitem, apenas, a garantir o direito de acesso à Educação, e não o direito de sucesso, ou seja, enquanto não soubermos ou quisermos desenvolver políticas que garantam maiores condições de igualdade nas aprendizagens.

Armando Dutra

Ministério da Educação promove a condenação da escola pública

O direito de informar, de se informar e de ser informado está consagrado no artigo 37º da Constituição da República Portuguesa, razão pela qual o Ministério da Educação, ao pretender usar desta liberdade, mais uma vez, tornou públicos os resultados dos exames nacionais do 12º ano, julgando que está a prestar um bom serviço ao país, fazendo jus à desejada transparência dos serviços públicos.
Não pretendo, de modo algum, pôr em causa o direito que os cidadãos têm de estar informados, no sentido de poderem formular uma opinião crítica e de terem um papel interventivo na sociedade à qual pertencem. Porém, quando essa informação é passível de manipulação, induzindo a juízos de valor menos correctos, é nossa obrigação alertar para algumas injustiças que se cometem.
O Ministério da Educação, nos seus intentos obscuros, insiste em pretender que a sociedade faça, de forma redutora, uma avaliação do trabalho desenvolvido pelas escolas através de uma mera leitura dos resultados dos exames nacionais, descontextualizados do processo ensino-aprendizagem e desfasados dos objectivos e finalidades a que o sistema educativo se propõe. Esquece-se, porém, que muitas das razões de tal insucesso são endógenas ao próprio sistema de que o Ministério é o principal responsável, não tendo demonstrado capacidade nem competência  para agir sobre elas.
Os exames não podem constituir o único instrumento de avaliação das escolas porque, como dizia um colega meu, constitui um ?termómetro avariado?, dado que, nas mesmas condições, nem sempre se comporta da mesma maneira. A demonstrá-lo está o facto de na mesma escola e com o mesmo professor os resultados obtidos nos exames  de uma determinada disciplina serem num ano bons e no outro maus, consoante as turmas. Tal facto explica a existência  de causalidades  múltiplas que interferem no processo de aprendizagem, pelo que estigmatizar escolas ou imputar responsabilidades directas a quem quer que seja, com base num único elemento de avaliação, é um exercício de irresponsabilidade.
Esta vontade explícita de condenação da escola pública e, quiçá, de exaltação do ensino privado, visível nos tão propalados ?rankings? das escolas, traduz uma desonestidade intelectual atroz, ao pretender-se comparar o incomparável, uma vez que só a pura hipocrisia não permite ver que as condições de acesso e de sucesso em ambos os sistemas são tão desiguais quanto o são as ambições, os projectos de vida e as  condições sócio-económicas das crianças e jovens que as frequentam. Basta ter em consideração que a escola pública vive apenas com os magros recursos financeiros do orçamento geral do Estado, enquanto as privadas partilham um duplo orçamento, o que vem do Estado e o que advém das gordas mensalidades das famílias, que, por sinal, detêm  os maiores recursos do país.
Vejam se nos colégios privados proliferam as turmas heterogéneas, as crianças com necessidades educativas especiais, os alunos provenientes de bairros degradados partilhando a fome, a miséria, a pobreza, o analfabetismo, o alcoolismo e a droga, se há diversidade étnica, se há quem divida quartos desconfortáveis com dois, três, quatro irmãos, ou outros familiares, sem uma secretária onde possam estudar, sem uma estante onde possam consultar uma enciclopédia e sem um computador onde possam aceder à internet . Vejam se nos colégios privados há meninos que nunca viram uma peça de teatro, manipularam um jornal ou uma revista, ou fizeram uma qualquer viagem marítima ou aérea, se há, porventura, quem tenha de partilhar os trabalhos rurais ou as tarefas domésticas a quem é entregue, muitas vezes, a responsabilidade de cuidar dos irmãos mais novos, de contribuir com o trabalho infantil para o sustento da família, ou de sofrer todo o tipo de violência para frequentar a escola sob ameaça de retirarem aos pais o dito rendimento social de inserção.
É importante que os governantes, os analistas, os fazedores de opinião tenham consciência de que é este mundo que a escola pública acolhe e que a privada rejeita. É bom que saibam que é na escola pública que estão as ?Joanas? deste país, e que é lá que se encontra a maioria das crianças e jovens que sofre, em silêncio ou com revolta, as injustiças da nossa sociedade. É bom que saibam que são os professores do ensino público que amparam este choque gritante da sociedade, a quem o sistema lhes pede para integrar e não excluir, para ser cooperante e não competitivo, para educar e não apenas instruir, em suma, para promover a cidadania solidária, os valores humanistas e não a competição, o individualismo, o egoísmo e o culto dos melhores.
Os professores do ensino público vivem o sufoco permanente da contradição do sistema que ora lhes exige e pede um modelo de ensino e de avaliação, sobretudo no Ensino Básico, do o 1º ao 3º Ciclo, que relativize os aspectos cognitivos em favor da construção da cidadania, dos comportamentos, das atitudes, dos valores, do saber ser e estar, impondo que a retenção dos alunos até ao 9º ano de escolaridade seja a menor possível, para evitar o abandono e insucesso escolar nem que seja administrativamente, para, logo de seguida, no Ensino Secundário fazer-se a inversão dos valores, onde a cultura da exigência e as finalidades do ensino se alteram radicalmente, apesar da tão defendida articulação curricular entre os diversos níveis e ciclos de ensino, esquecendo-se de que faltam aos jovens os hábitos de trabalho e as bases necessárias para o desejado sucesso.
Sente-se que estamos a viver um período de grande confusão, clara indefinição e alguma tensão, onde parece sobrelevar algum desejo de regresso ao passado. Os professores sentem-se ?desnorteados? neste terreno movediço onde ora se exaltam as virtudes dos exames e se exige que todo o esforço de aprendizagem seja direccionado neste sentido, ora se relativiza a sua importância e exalta a avaliação contínua assumindo que não é possível nem justo pretender-se avaliar numa ou duas horas o que foi construído em vários anos. Importa salientar que, não raras vezes, se acusam as equipas ministeriais de estarem distanciadas da realidade escolar, com critérios de exigência desfasados do contexto educativo e das aprendizagens reais dos alunos.
É com esta dualidade de critérios que o Ministério da Educação entra em contradição ao pretender, por um lado, que a sociedade avalie o trabalho das escolas e dos professores tendo, unicamente, por base o resultado dos exames nacionais, quando, por outro lado, o próprio Ministério lhe atribui apenas um peso relativo para a nota final dos alunos, o que, só por si, traduz a pouca significância que estes, no seu entender, devem ter no contexto global do processo educativo.
Não é possível continuar a alimentar esta ambiguidade, sob pena de se instalar o caos na escola pública. Quem sabe se não constituirá o propósito de alguns!   

                                                                                  Armando Dutra

Avaliação de alunos, de professores ou de escolas…!?

O secretário regional da Educação e Ciência (SREC) presenteou, no último Natal, a comunidade educativa açoriana com um novo Regulamento de Avaliação das Aprendizagens no Ensino Básico publicado, no dia 23 de Dezembro, em anexo à Portaria n.º 94/2004.

Recentemente, nesta coluna e sob o título ? “Sistema Educativo Regional” segundo Álamo de Meneses ?, aflorei, ainda que sumariamente, as questões relacionadas com a que era, na altura, uma proposta de avaliação para o ensino básico na Região referindo-me, no essencial, ao facto do SREC se estar a preparar para publicar um modelo de avaliação diferenciado do que se aplica ao restante território nacional (continente e Madeira) e, assim, dar mais um passo para a criação de um Sistema Educativo Regional, aliás o seu grande objectivo político.
A comunidade educativa está, só agora, a “desembrulhar” esta prenda natalícia e a tomar consciência das implicações que as alterações introduzidas na avaliação do ensino básico, de entre as quais a introdução de “exames” no 4.º, 6.º e 9.º anos, talvez não visem aqueles a quem o processo de avaliação se dirige ? os alunos.
A avaliação sumativa externa é da responsabilidade da Direcção Regional de Educação (DRE) e materializa-se na realização de provas no final de cada ciclo do ensino básico nas áreas disciplinares de Língua Portuguesa e Matemática, no entanto, a valorização da avaliação sumativa externa (exames) para a classificação final dos alunos, no respeito pela autonomia pedagógica, fica ao critério dos Conselhos Pedagógicos de escola, ou seja, cada escola poderá atribuir à classificação obtida pelos alunos a valorização que entender (5%, 10%, 20%, 30% … ou outro qualquer).
O facto da entidade responsável pela avaliação externa (DRE) não lhe definir um peso próprio no cálculo da classificação final dos alunos, deixando essa responsabilidade a cada unidade orgânica e, sabendo-se que o SREC pretende tornar público os resultados da avaliação sumativa externa, só pode ter um significado ? a avaliação do sistema; visto que a avaliação feita aos alunos continua, e bem, a depender das escolas.
Outros efeitos serão produzidos pelas alterações que a Portaria n.º 92/20004 veio introduzir na avaliação da aprendizagens do Ensino Básico, bastará, para tanto, fazer-lhe uma atenta análise. No entanto, hoje apenas pretendo enfatizar o aspecto a que me tenho vindo a referir e que ,claramente, visa a avaliação das escolas que, naturalmente, será transformada num “ranking” regional, com todos os efeitos perniciosos que lhe estão associados.
A avaliação não é, no seio dos docentes, um assunto que reúna unanimidade e é do conhecimento público que relativamente à realização de exames no Ensino Básico alguns professores, talvez em busca da autoridade perdida, os defendem acerrimamente, outros, como eu, valorizam os percursos, os contextos, a avaliação formativa e globalizante.
Mas será, para quem considera que os exames são uma peça essencial no processo de avaliação, que estes são os exames de que estavam à espera? É que estes exames não vão responsabilizar alunos, não vão disciplinar alunos, não vão contribuir para que os alunos saiam melhor preparados da escola. Estes exames vão servir, isso sim, para continuar a proletarizar os professores, estigmatizar as escolas e denegrir a imagem do ensino público.
Importa, igualmente, que os Pais e Encarregados de Educação estejam atentos às alterações que foram introduzidas no modelo de avaliação das aprendizagens do ensino básico, desde logo, questionando-se porque não foram criadas condições para participarem na discussão deste instrumento da avaliação dos seus filhos e educandos. instrumento que os diferencia das restantes crianças e jovens que vivem no território continental e madeirense.
Até onde deixaremos ir o Professor Álamo Meneses neste processo de ostracização do ensino na região?

14-01-2005
Aníbal C. Pires

Exames no Ensino Básico

Uma questão controversa!

Como todos se recordam, foi o CDS Partido Popular, através do seu Presidente Paulo Portas, quem, na última campanha eleitoral, mais exaltou as virtudes deste processo de avaliação, tão característico de uma escola tradicional onde a exigência, o rigor, a ordem, a autoridade e a disciplina, associada ao castigo, criavam a atmosfera e a ambiência propícia a uma aprendizagem que tinha objectivos muito concretos e facilmente mensuráveis, traduzidos na aprendizagem dos conteúdos programáticos das diversas disciplinas que se eternizavam no tempo, através de manuais escolares que, no mínimo, satisfaziam as necessidades de uma geração, por entender-se que tais saberes, considerados estruturantes e essenciais, garantiam a necessária formação do homem e do desenvolvimento da sociedade.
Estávamos perante uma escola onde a aquisição dos saberes não dependia apenas da vontade individual, recorrendo, com facilidade, à chamada ?motivação extrínseca?, onde o vime, a régua e a palmatória estavam quase sempre presentes na aprendizagem da tabuada, das contas, dos ditados, dos problemas, das célebres ?lições de cor? e onde a palavra de ordem dava lugar ao silêncio porque os resultados, a bem ou a mal, tinham que aparecer, não fosse o Sr. Professor ficar envergonhado no exame dos seus alunos, geralmente realizados na sede do Concelho. Importa, contudo, salientar que o exame não era para todos, era apenas para aqueles que tinham dado provas ao professor que iam fazê-lo com sucesso.
Nesta escola, regra geral, de quatro classes, normalmente dividida por sexos, de trinta, quarenta ou mais alunos por turma, onde a indisciplina nunca foi problema, muitos não tinham lugar, porque apenas tomavam assento os que queriam aprender ou aqueles a quem os pais davam a oportunidade de experimentar se pretendiam a fadiga da cabeça ou, caso contrário, o sacrifício do corpo. Recorde-se que a vida, quer em terra quer no mar, era rude e dura, em virtude de serem poucas as tecnologias mecanizadas que estavam ao serviço do homem.
Na verdade, dispunha-se de um sistema educativo que exigia do docente mas, em contrapartida, concedia-lhe autoridade, liberdade de acção e reconhecimento social, porque, nesta sociedade, cada um era mestre na sua arte, razão pela qual todos confiavam no trabalho do professor que, praticamente, se preocupava com a instrução dos seus alunos, rentabilizando, ao máximo, o tempo disponível, porque a educação, assente no respeito pelos mais velhos, pelos superiores, pela autoridade, pelas instituições e pelos valores da época, era um dado adquirido que raros ousavam pôr em causa. As atitudes e valores não constituíam objecto de avaliação, porque o saber ser e estar, fruto do temor ou da repressão, era um dever normal de qualquer cidadão.

Democratização da sociedade

Transformação do papel da escola

Com o 25 de Abril de 1974 a sociedade portuguesa democratizou-se, exaltaram-se os valores individuais, valorizou-se a liberdade, sentiu-se o progresso, experimentou-se a vida fácil, modificaram-se os hábitos familiares, em suma, transformou-se a sociedade e, por conseguinte, o papel da escola. É no contexto desta evolução, marcada pelo desenvolvimento das ciências da educação, das teorias da aprendizagem, dos métodos e técnicas de ensino, das sucessivas experiências e reformas, que a escola não consegue alcançar os resultados desejados, surgindo daí um certo saudosismo, ainda que envergonhado, de regresso ao passado. A uma escola segregadora e selectiva sucedeu uma escola democrática e permissiva, onde se pensava que a aprendizagem lúdica e a magia do professor seriam suficientes para compensar a supressão do esforço do aluno.
Perante o reconhecimento do demasiado facilitismo que os sucessivos governos promoveram, com fins meramente estatísticos, mas que agora não pretendem publicamente assumir transferindo, injustamente, o ónus da questão para o professor, surgem algumas medidas supostamente tendentes a moralizar e a credibilizar o sistema.

Introdução de exames regionais

Tanto no espaço nacional como no regional, a introdução dos exames ao nível do Ensino Básico afigura-se, novamente, como a solução do problema. Curiosamente enquanto a Srª Ministra da Educação, posicionada no espectro político mais à direita, ainda não teve a coragem de implementar todas as medidas preconizadas pelo seu parceiro de coligação, ao defender a aplicação dos exames de forma extensiva ao 4º, 6º e 9º ano de escolaridade, porventura por considerar que tal decisão seria demasiado forte, pondo em causa a escola democrática, muitas teorias da educação e a política educativa seguida até então, eis que na Região, com um governo posicionado num espectro político mais à esquerda, o Sr. Secretário da Educação e Ciência não se faz rogado em introduzir, embora com outra designação mas com o mesmo espírito, os ditos exames, com o nome de provas aferidas, nos anos terminais de ciclo, para gáudio, concerteza, do Dr. Paulo Portas.
Se estou errado, digam-me em que diferem estas provas aferidas dos exames do 9º ano de escolaridade anunciados pela Srª Ministra da Educação? Não são realizados por uma entidade externa à escola, neste caso a Direcção Regional da Educação? Não se aplicam à generalidade dos alunos no âmbito da Língua Portuguesa e da Matemática? Não interferem na avaliação sumativa dos alunos em cerca de 25%? A única diferença é que o Sr. Secretário da Educação e Ciência pretende ?matar dois coelhos com uma cajadada?, ou seja, sob a capa da avaliação aferida, generalizar a aplicação dos exames a todos os ciclos de ensino.
Não pretendo com esta argumentação fazer juízos de valor positivos ou negativos, embora, como cidadão, me sinta confuso com estas e outras decisões que rompem com os quadros de referência que deveriam nortear os governos, consoante as suas orientações politico-partidárias. O que pretendo, sobretudo, é alertar para algumas incongruências que me parecem evidentes e para a necessidade de se clarificar que rumo queremos dar à educação, sob pena de se instalar a maior confusão sobre quem tem a nobre mas difícil tarefa de educar.

Exames do Ensino Básico: o que se pretende?

A questão que coloco é muito clara: O que é que se pretende com a introdução dos exames no Ensino Básico? No final do Ensino Secundário, pode concordar-se ou não, ainda se compreende porque visa criar mais um obstáculo para o acesso ao Ensino Superior. Agora no Ensino Básico, numa escolaridade obrigatória que é de nove anos e que em breve passará para doze, considerando as orientações da política educativa actual, é bem mais difícil de entender. Na verdade, o que me parece é que se pretende desacreditar a avaliação contínua, porque os exames vão, precisamente, demonstrar que os resultados da avaliação interna não correspondem aos da avaliação externa pondo, assim, em causa, perante a opinião pública, a credibilidade dos professores e da sua avaliação. Importa, por isso, esclarecer esta questão.
Quando um docente faz a avaliação dos seus alunos, no Ensino Básico, o sistema obriga que ele tenha em consideração um conjunto de critérios dos quais o conhecimento representa apenas dois terços ou três quartos da nota que é atribuída no final do período ou do ano. Não admira, pois, que muitos alunos de nível três venham a ter resultados negativos no exame, porque este apenas avalia conhecimentos. Se pretendemos evitar ou pelo menos diminuir estas aberrações e passar a valorizar apenas o conhecimento, como era no passado, o sistema educativo tem de ser claro perante a sociedade e honesto para com os professores, pois não pode exigir que estes sigam um certo caminho e cumpram com determinados objectivos, para depois  pretender avaliar e julgar o seu trabalho tendo em conta outros parâmetros. Se pensam que com os exames estão a repor a verdade na avaliação, ou se pretendem com eles criar tampões para dificultar a transição dos alunos entre os diversos ciclos, creio que mais facilmente atingiriam esses objectivos  se dessem indicações claras aos professores para fazerem uma avaliação criteriosa, com base nos reais conhecimentos dos alunos , em função dos conteúdos programáticos.
Reparem só nas orientações preconizadas, na Região, para o 1º Ciclo do Ensino Básico, em matéria de retenção, e digam-me que resultados se podem esperar no exame ou na prova aferida que os alunos farão no 4º ano de escolaridade. No 1º ano de escolaridade não há lugar à retenção, o que quer dizer que todos passam do 1º para o 2º ano. No 2º e 3º anos de escolaridade a retenção é uma medida pedagógica de carácter excepcional e só pode ocorrer, entre outras circunstâncias, se tiver a concordância do encarregado de educação. Perante este cenário, onde é retirado ao docente a capacidade de decisão da progressão ou retenção do aluno, como é que se pode responsabilizar o professor se o sistema é que determina a condução de todo o processo ensino-aprendizagem, permitindo que os alunos possam transitar de ano para ano, nos outros ciclos, com duas, três ou mais negativas, num constante acumular de insucessos, para depois exigir, em provas nacionais ou regionais, bons resultados nos finais de ciclo?
Os governos têm legitimidade para decidirem as políticas educativas que entenderem mas, ao menos, façam-no com coerência, clareza e respeito pelos outros.

Armando Dutra

A Educação no III Governo de César ou o “Sistema Educativo Regional” segundo Álamo de Meneses

Os sinais evidenciados pela política educativa seguida pelos governos de Carlos César e levados à prática pelo Secretário Regional que, desde o primeiro momento desta dinastia, tutela a Educação são cada vez mais explícitos e apontam, claramente, para a intenção objectiva de criar para os Açores um Sistema Educativo próprio.
Da ténue diferenciação, que caracterizou o período da maioria relativa do PS, à introdução de profundas alterações durante a anterior legislatura o Professor Doutor Álamo de Meneses foi, de conquista em conquista, impondo um quadro legal para a Educação que, cada vez mais, configura a demarcação do Sistema Educativo Nacional e a criação de um Sistema Educativo Regional. Esta tarefa que o Secretário regional da Educação tem vindo a assumir com grande ênfase foi facilitada com a última revisão constitucional que, como é do domínio público, transferiu para as Regiões Autónomas poderes acrescidos.
O derrube das barreiras constitucionais e a legitimação eleitoral das políticas regionais para a Educação terão deixado o Professor Doutor Álamo de Meneses em estado de êxtase que, não se fazendo rogado a tantas facilidades já produziu uma portaria sobre a avaliação dos alunos do ensino básico sem que os encarregados de educação, professores e escolas tivessem oportunidade de se pronunciar sobre tão importante normativo, aliás como tem sido seu apanágio.
A Educação Especial, os concursos de pessoal docente, a formação contínua de professores, o calendário escolar, as vias diferenciadas no 2.º e 3.º ciclos do ensino básico, os currículos regionais e agora a portaria da avaliação, são alguns, dos muitos exemplos que caracterizam, por um lado, o que atrás afirmei sobre a intenção de separar a Educação na Região, da Educação no território continental e da Madeira, por outro lado os expedientes e a ausência de respeito pelos intervenientes no processo educativo que, desde sempre, caracterizaram o titular da pasta da Educação nos governos de Carlos César que, ao invés de procurar soluções consensuais com os parceiros sociais – Sindicatos, Escolas e Encarregados de Educação -, impõe a sua magnânime vontade e modelo. 
Nem o espaço nem esta tribuna permitem dissecar com profundidade a política educativa dos últimos 8 anos, nem é minha pretensão, aqui e agora, analisar o programa do Governo Regional para este quadriénio, no entanto, o fulgurante início de mandato do Secretário da Educação justifica esta reflexão que não poderia deixar de partilhar com os leitores. Ao aprovar um modelo de avaliação para os alunos do Ensino Básico que introduz exames regionais a Língua Portuguesa e Matemática no 4.º, 6.º e 9.º anos (provas aferidas que são simultaneamente provas de avaliação sumativa externa) e desligando-se do modelo de avaliação para os alunos Ensino Básico vigente no restante território nacional, o Secretário Regional da Educação, despudoradamente, deixou à margem de tão importante discussão os intervenientes no processo educativo.
Será que os pais dos alunos das escolas da Região aceitam ver os seus filhos ser avaliados de forma diferente daquela que é utilizada para avaliar os alunos do território continental? Alguém lhes perguntou?
Será que as Escolas vão abandonar Projectos Educativos e Planos Curriculares de Turma para configurar o processo de ensino aprendizagem na formatação de crianças e jovens aptas a realizar exames? Onde fica o primado da avaliação formativa e globalizante?
Tenho consciência que estou a pisar um terreno delicado mas, em consciência, considero que, esta e outras medidas anteriormente impostas, pela ?dinastia de César?, na área da Educação têm de ser questionadas, não só pelos docentes mas, sobretudo, pela sociedade civil pois carecem de reflexão, estudo e aprofundamento pelas implicações que, a prazo, terão na sociedade açoriana.
Em matéria de Educação tudo se pode esperar deste Governo e deste Secretário, um Sistema Educativo Regional traz, incontornavelmente, associado um Currículo Regional, um Estatuto de Carreira Docente Regional e, claro, um perfil e competências próprias para os alunos açorianos.
Terá sido esta política educativa que os eleitores açorianos sufragaram em Outubro de 2004?

Ponta Delgada, 16 de Novembro de 2004
Aníbal C. Pires
anibalpires@sapo.pt

Na Educação há órgãos a mais e democracia a menos

Há poucos dias, ouvi um porta-voz do Governo anunciar a criação de um Conselho Coordenador do Sistema Educativo, uma espécie de órgão de cúpula, com uma composição bastante alargada, o que, aos olhos da sociedade, pode ser interpretado como um gesto de vitalidade democrática, um sinal de que a política educativa regional não é produto, apenas, de uma mente iluminada, mas resultante de contributos vários dos agentes educativos e da sociedade civil que, através da criação de tal órgão, se pretendem, agora, institucionalizar.
Importa dizer que a construção e o aprofundamento da democracia não depende directamente do número de órgãos que se cria mas, sobretudo, do grau de participação e envolvimento dos que já existem, que não são poucos, do reconhecimento da sua legitimidade e da sua autonomia. Se há défice de participação dos professores, dos alunos, dos pais, das autarquias, dos parceiros sociais e das forças vivas da sociedade não é por falta de órgãos, basta, somente, que se criem as condições para que funcionem e, acima de tudo, haja, da parte do poder político, a vontade suficiente para os ouvir e a abertura necessária para acolher as suas propostas e sugestões.
Julgo que na Educação há órgãos suficientes para assegurar uma participação democrática, desde que se respeitem e promovam as competências das Assembleias de Escola, Conselhos Executivos, Conselhos Administrativos, Conselhos Pedagógicos, Departamentos Curriculares, Conselhos de Núcleo, Conselhos de Turma, Conselhos de Directores de Turma, Associações de Pais, Associações de Alunos, Conselhos Locais de Educação e demais estruturas representativas dos professores. O que é preciso é que eles não sejam ignorados, instrumentalizados, desiludidos ou subalternizados.
Em democracia os órgãos não servem para legitimar políticas mas para ajudar a construí-las. Infelizmente, continuamos a confrontar-nos com estilos de governação que de democracia só têm o nome. O mais recente exemplo foi o da portaria nº 92/2004, que anexa o Regulamento de Avaliação das Aprendizagens no Ensino Básico, um diploma de enorme relevância para a Educação, publicado unilateralmente, fazendo tábua rasa dos órgãos existentes nas escolas, exceptuando a diligência de obter o aval ?forçado? dos Conselhos Executivos, sem que estes tivessem o tempo necessário para analisar e debater o conteúdo deste diploma com os demais órgãos de administração e gestão e com as estruturas de orientação educativa das suas escolas, constituídos com igual legitimidade democrática.
Devo referir que, no plano nacional, o Ministério da Educação, neste mesmo contexto, publicou o despacho nº 1/2005 que, nalguns aspectos, reconheço, é ainda pior do que o diploma regional, só que o mal dos outros não serve para nosso consolo e muito menos deve servir para desculpa dos nossos erros. Não deixo, porém, de relevar o gesto de terem colocado o diploma em Consulta Pública salvaguardando, ao menos, a aparente formalidade do zelo democrático. Isto porque o que condenamos não é apenas o conteúdo das decisões, é, também, a forma como elas se processam, sem diálogo e sem respeito pelos órgãos instituídos, com a agravante de, não raras vezes, dizer-se uma coisa e fazer-se outra, o que faz desacreditar as pessoas e descredibilizar as instituições. Não podemos continuar a aceitar que a Secretaria da Educação, perante os parceiros sociais, não cumpra com aquilo que promete. No caso concreto deste diploma, o Sr. Secretário da Educação foi alertado para o défice de participação existente na sua construção, tendo afirmado que o mesmo só seria publicado em Janeiro, dando, assim, oportunidade aos Executivos de o apresentarem aos demais órgãos das escolas para apreciação quando, provavelmente, tendo em conta a data, já o teria mandado para publicação. Por mais boa vontade que haja, deste modo, não é possível trabalhar com seriedade e honestidade, no respeito pela ética democrática. Apetece-me perguntar, com esta visão e esta atitude, para que queremos mais órgãos?
Espero, sinceramente, que subjacente à institucionalização do referido órgão de cúpula, agora criado, não esteja a intenção de anular o papel e a acção dos órgãos de base das escolas, aqueles onde, verdadeiramente, se vivem e sentem os problemas, aqueles que, em contacto directo com a realidade, melhor que ninguém, estão em condições para dar contributos válidos para a construção de uma política educativa realista, não visionária, ajustada ao meio sócio-cultural que temos, para a qual as pessoas trabalhem por convicção e não por obrigação. O que nos preocupa não é a maior ou menor facilidade na obtenção dos diplomas ou dos graus académicos, preocupa-nos, isso sim, a formação das pessoas, a sua preparação para enfrentarem um mundo cada vez mais competitivo. Promover sucessos meramente administrativos é condenar gerações e, para isso, não contem com os professores.
Para além das questões levantadas, outras há que importa desenvolver em momento oportuno. Porém, não deixo de dizer que é uma aberração total publicar um diploma sobre a avaliação dos alunos, com efeitos imediatos, quando já estamos no início do segundo período do ano lectivo. Com que princípio, com que critério se alteram as regras do jogo a meio de um percurso? É o próprio diploma que diz, no seu artigo 7º, que no início do ano lectivo se devem definir os critérios de avaliação para cada ciclo e ano de escolaridade e, no nº 7, artigo 12, que a deliberação sobre a realização de provas globais ou trabalho final deverá obrigatoriamente ocorrer até ao final do primeiro período de cada ano lectivo. Estas incongruências traduzem tudo. Resta-nos a esperança de que o esforço do Sr. Ministro da República ao promover, nos próximos meses, um profundo e intenso debate sobre as questões da cidadania, contribua para fortalecer o espírito democrático, sobretudo dos que se dizem estar ao serviço da democracia, e abra caminho ao direito que os cidadãos têm de exerçê-la de modo livre, consciente e responsável.

Armando Dutra

O maior ataque de sempre à Educação

Em defesa da nossa dignidade profissional, manifesto a mais profunda indignação pelo modo insultuoso, desrespeitador e injusto como o Sr. Primeiro-Ministro, aquando da sua intervenção no Debate Mensal na Assembleia da República sobre a situação orçamental do País, se referiu ao trabalho de milhares de professores com horário zero ou dispensados de serviço docente no ano de aposentação, afirmando que estes recebiam o seu vencimento sem prestarem efectivo serviço público.
Perante afirmação tão grave, só desculpável com o total desconhecimento do que é a realidade do nosso Sistema de Ensino e do exercício da função docente, uma vez que confunde serviço docente com actividade lectiva, como sindicalista, sinto o direito e o dever de, perante a sociedade, corrigir tal desinformação, afirmando que, em qualquer das situações referidas, os professores estão ao serviço da Escola, exercendo múltiplas actividades nos apoios educativos, substituições, clubes escolares, biblioteca, produção e organização de documentação pedagógica, além do seu envolvimento em outros projectos de natureza diversa, e que, nestas circunstâncias, o seu horário de zero só tem o nome, porque cumprem 35 horas semanais.

O desgaste físico e psicológico do professor

Os professores estão hoje a viver, mais do que nunca, as injustiças daqueles que, em determinados momentos, enaltecem a nobre mas difícil tarefa de educar, exaltando a Educação como a alavanca fundamental do desenvolvimento, para, depois, desprezarem e desqualificarem o seu trabalho, situando-o ao nível do desempenho burocrático.
É mais que reconhecido e comprovado, no plano da Saúde, o desgaste psicológico da profissão docente. Não se compreende como é que o Governo, que defende a inovação, a aposta nas tecnologias e a produtividade do país, prefere pagar o subsídio de desemprego aos milhares de jovens professores, que estão no auge da sua capacidade de trabalho, para manter no activo um grupo de docentes, com mais de 36 anos de serviço, na sua maioria desencantados, desmotivados e frustrados nas suas expectativas, face às alterações repentinas das condições de aposentação na ponta final da sua carreira, os quais, em última instância, mais não farão do que, resignadamente, deixar que o tempo passe, até que o infortúnio os retire do seu posto de trabalho.

A ideia errada das progressões automáticas dos professores

O recurso à mistificação da progressão automática aplicada aos professores, tem sido outra das ?pedras de arremesso? utilizadas com o propósito declarado de denegrir a imagem da classe e abrir caminho à necessidade da revisão do seu Estatuto de Carreira. É da mais elementar justiça referir que não há docente que progrida na carreira sem se sujeitar à elaboração de um relatório crítico do desempenho da sua actividade, objecto de avaliação, e à frequência, com aproveitamento, das acções de formação consideradas necessárias pelo Sistema. Existem vários docentes que, por não cumprirem estes requisitos, não progrediram na sua carreira, não beneficiaram da dita ?progressão automática?, que, agora, dizem todos beneficiar.
Depois de uma vida de árduo trabalho e, para muitos, de autêntico sacerdócio, ao serviço da Educação e do Ensino neste país, a recompensa que o Governo encontra para os docentes, em final de carreira, é a sobrecarga de cargos e outras funções de coordenação e direcção a acrescer à sua actividade lectiva, sem qualquer redução de tempo para o efeito. É este o presente que nos querem dar após muitos anos de trabalho, que, por ser tão bom, muitos docentes preferem abdicar dele em favor da actividade lectiva, pelo facto de reconhecerem que o tempo presentemente atribuído para o desempenho de tais cargos e funções é manifestamente insuficiente para a sua concretização, tendo em conta a crescente burocracia e exigências dos mesmos.

Que qualidade nas funções pedagógicas?

Há pensamentos que, no plano teórico, podem parecer aceitáveis, mas que, no plano prático, são, de todo, indesejáveis, porque os seus efeitos são mais perniciosos do que benéficos. Imagine-se, porventura, que todos os cargos passariam a ser atribuídos aos docentes mais antigos e que os mais novos tinham de cumprir rigorosamente as 22 horas lectivas semanais. Pense-se naquelas disciplinas que só têm um bloco por semana, o equivalente a 2 tempos lectivos. Sabem quantas turmas teria de ter um professor, nestas circunstâncias, para cumprir o seu horário? Sabem quantos alunos ficariam atribuídos a esse professor? Pois seriam 11 turmas e cerca de 275 alunos. Que pedagogia diferenciada se lhes pode exigir quando, provavelmente, nem o seu nome saberão até ao fim do ano ? Que modelos de avaliação poderão ser aplicados com este número de alunos? Que trabalho de articulação curricular poderá desenvolver-se nestas circunstâncias?
Com as medidas anunciadas, em nome do défice e de uma pseudo-justiça, que só servem para desculpar os erros da Governação e da acção política, concluímos que o lema inovador deste Governo é: ?quanto mais velho mais trabalho e quanto mais novo menores oportunidades.  Viva o desemprego !?, ao serviço da recuperação económica.

Armando Dutra

Algures Entre a Escola do Embondeiro e a Verdadeira Escola

A PROPÓSITO DO DESPACHO NORMATIVO Nº 48/2005 De 11 de Agosto

O início deste ano lectivo foi claramente marcado pelo agravamento das condições de trabalho dos professores, já que a componente lectiva dos docentes cresceu, em geral, sete tempos lectivos e a permanência na escola para vinte e seis horas. Mas como se operou este verdadeiro ?milagre de multiplicação??
Até à reorganização curricular do ensino básico, as horas lectivas dos professores eram contabilizadas em segmentos de 50 minutos incluindo os dez minutos dos intervalos. Com a referida reforma, os professores passaram a ter que cumprir, na escola, a diferença dos cinquenta para os quarenta e cinco minutos, que representavam noventa minutos semanais que eram ocupados em tarefas de coordenação pedagógica, actividades de complemento curricular ou outras tarefas de carácter não obrigatório para os alunos.
Quando se operou a reorganização curricular do ensino secundário e a consequente passagem dos tempos de cinquenta para quarenta e cinco minutos este diferencial foi automaticamente convertido em tempos lectivos. Abriu-se assim o precedente para o actual ?milagre da multiplicação? dos horários docentes.
Concluindo, o referido despacho aumentou a carga lectiva dos professores em cerca de trinta por cento, essencialmente à custa das pausas não contabilizadas na componente lectiva. Usando como exemplo um horário de vinte e duas horas, o docente que teria vinte e dois tempos de cinquenta minutos mais os dez minutos de intervalo, ficaria com a sua componente lectiva completa. Com a aplicação do despacho, o horário de vinte e duas horas é transformado num horário de vinte e nove tempos lectivos, resultando numa diminuição das despesas da Secretaria Regional da Educação e Ciência, com pessoal docente, na proporção acima referida, ou mais, como se verá adiante e como consequência social o aumento do desemprego docente.
Quanto à questão das vinte e seis horas de permanência na escola parece-nos que o principal problema prende-se com a ausência de espaços e condições materiais, arriscava a dizer, em todas as escolas da região e, muito provavelmente, do país. Quando os governantes dão o exemplo dos países desenvolvidos para comparar as diferenças de cumprimento de horário na escola com o nosso país, esquecem que estamos ainda a meio caminho entre a ?escola do embondeiro? e uma ?verdadeira escola?, pois sabem perfeitamente que se os professores não trabalharem em casa, não têm meios para o fazer na escola. Aliás, este constitui o único motivo porque os docentes não cumprem as trinta e cinco horas na escola como qualquer funcionário público. O trabalho em casa, realizado com meios próprios é dinheiro poupado ao erário público.
O que ficou para os professores fazerem em nove horas semanais de trabalho ?individual? é impossível de realizar neste espaço de tempo, a saber: preparação das aulas, elaboração de fichas de diagnóstico, de fichas formativas e de testes de avaliação, correcção dos mesmos, reuniões de avaliação, reuniões no âmbito da disciplina e do departamento. Por outro lado, os professores ainda têm que cumprir no estabelecimento de ensino, a diferença entre as vinte e duas horas de efectiva leccionação contabilizados ao minuto e as vinte e seis horas, excedendo claramente o horário semanal de trinta e cinco horas.
Na verdade, este despacho permitiu a revogação do diploma equivalente que atribuía às escolas um crédito de horas para ser usado em apoios educativos e nas reduções da componente lectiva dos professores para o exercício de cargos de coordenação pedagógica o que permitiu mais uma poupança a somar à já referida. Pois o exercício dos referidos cargos com excepção da direcção de turma passam a ser exercidos na componente não lectiva e os apoios e substituições na componente lectiva ou para- lectiva(?).
Por último, fica aqui a dúvida: quem fala verdade? O Senhor Secretário ou o Presidente do Governo? Temos ou não dificuldades orçamentais?

António Lucas

O Despacho que põe em causa a qualidade da acção pedagógica

É com enorme preocupação e perplexidade que, como membro da direcção do Sindicato dos Professores da Região Açores, assisto, por parte da Secretaria Regional da Educação e Ciência, a regulamentação de matérias relevantes do Estatuto da Carreira Docente, no âmbito da componente lectiva e não lectiva, que subverte o espírito e os princípios consagrados nos seus artigos, com propósitos marcadamente economicistas, sem que haja a menor preocupação de ouvir os docentes, nem de negociar com as suas estruturas representativas – os Sindicatos – contrariando, assim, o princípio da democracia participativa que a Constituição da República Portuguesa proclama.
A contestação ao Despacho Normativo nº 48/2005, de 11 de Setembro, faz-se não apenas pelo seu conteúdo, mas também pela falta de oportunidade desta regulamentação, que ocorreu extemporaneamente, quando a preparação do ano escolar já estava em curso, baseada na legislação então vigente, obrigando os Conselhos Executivos, através de ordens e contra-ordens, a reformular, à última da hora, os horários dos docentes, de modo a ajustá-los, quanto possível, ao novo diploma.

Agravamento da componente lectiva

A engenharia de cálculos horários que este normativo encerra, sem qualquer paralelo no Continente e na Região Autónoma da Madeira, ao converter as 22 horas lectivas em minutos, para depois dividi-las em segmentos de 45 minutos, agravou substancialmente a componente lectiva dos docentes que, em vez dos 22 segmentos lectivos que tinham anteriormente, passam agora a ter 29 segmentos para actividades lectivas e para-lectivas, porque o tempo destinado aos intervalos, necessário à mudança de salas de aula, ao transporte de livros de ponto e busca de materiais pedagógicos na reprografia, foi, para espanto e indignação de todos, suprimido do tempo lectivo, situação sui generis no país. Como a estes 29 segmentos ainda se acrescem mais 4 horas para actividades técnico-pedagógicas e mais duas para reuniões, isto significa que ao professor não lhe sobra tempo para a necessária preparação das aulas e correcção de trabalhos e testes, sejam eles formativos ou sumativos.
Este agravamento da componente lectiva, contrariamente ao que se quer fazer crer, não visa dar mais apoios aos alunos, porque estes apoios já estavam contemplados em legislação anterior, tem, isso sim, um objectivo muito claro que é o de fazer com que as funções de apoio educativo e substituições, que anteriormente davam ?ganha pão? a mais alguns docentes, passem a ser desempenhadas pelos professores do quadro das Escolas, evitando, deste modo, algumas contratações que irão contribuir para engrossar a enorme lista dos 40.000 desempregados.
Com este despacho ganham as finanças mas perde a educação, porque ao aumentar a componente lectiva dos docentes e ao diminuir o tempo destinado ao seu trabalho individual, que passa a ser de apenas 7 horas ou menos por semana, consoante o número de reuniões que ocorram na Escola e que são muitas porque o trabalho está cada vez mais burocratizado, a qualidade da acção pedagógica tenderá a agravar-se. Isto porque o pouco tempo que têm para a preparação das aulas, pesquisa de informação e construção de materiais, levará a que estas sejam cada vez mais expositivas, as avaliações cada vez mais simplificadas e as respectivas correcções cada vez mais tardias.

Que tempo para trabalho individual?

Uma simples operação aritmética é suficiente para demonstrar que o tempo destinado ao trabalho individual dos docentes nem, ao menos, dá para a correcção dos testes. Um professor com 7 turmas, ou seja, com 175 alunos, ao fazer 2 testes por período, necessita de corrigir 350 provas, que, numa base mínima de 25 minutos para  correcção de cada uma, perfaz um total de 146 horas, o equivalente a uma média de 12 horas por semana, isto sem contar com a sua elaboração ou correcção de quaisquer outros trabalhos, nem falar em preparação de aulas, onde cada vez mais se exigem pedagogias activas e diferenciadas.
Tendo em consideração que as 7 horas por semana, que o Sr. Secretário da Educação e Ciência atribui para o referido trabalho individual do professor, o único que não é marcado no horário, equivalem a 84 horas no período, se as subtrairmos às 146 horas que eram necessárias à mera correcção dos testes, concluímos que só para esta função o professor fica com um saldo negativo de 62 horas.

Degradação do trabalho pode por em causa a qualidade da acção pedagógica

Está assim demonstrado que a qualidade da acção pedagógica dos docentes pode realmente estar em causa e que não é justo avaliar o trabalho dos professores apenas pelo tempo que passam na Escola, porque tenho a certeza que se todos começarem a contabilizar o seu tempo a Educação é que irá perder. Não queiram que os profissionais da educação e ensino trabalhem com os nossos filhos como quem trabalha com matéria inerte, que se coloca de lado na secretária às 17 horas da tarde para se retomar no dia seguinte às 9 horas da manhã.
Discordo da visão redutora daqueles que querem fazer depender o aumento da eficácia do Sistema Educativo da ?funcionalização? dos educadores e professores. Não obstante, se for essa a pretensão do Governo, há que criar nas escolas as condições mínimas necessárias para que possam desempenhar, com eficácia e dignidade, as 35 horas da função pública, de modo a realizarem não só todo o trabalho inerente à componente lectiva, mas também o respeitante à componente não lectiva, libertando, assim, os docentes da imensidão de preocupações e tarefas que transportam consigo para o espaço familiar, com todos os custos logísticos inerentes em matéria de equipamento e material.
Os Educadores e Professores são profissionais responsáveis e dedicados mas não são escravos do trabalho e das decisões solitárias e pouco reflectivas de quem tem responsabilidades políticas.

                                                                                  Armando Dutra

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